As criptomoedas podem ser definidas como tokens de pagamento, uma espécie de ativo digital, registrado em blockchain ou na infraestrutura DLT, que podem ser armazenadas, trocadas ou transferidas P2P eletronicamente.
A Universidade de Cambridge publicou o seu primeiro estudo intitulado “Global Cryptoasset Regulatory Landscape Study“, datado de julho de 2019, no qual a academia pretendeu catalogar diferentes espécies de ativos digital e suas usabilidades. Numa tradução livre, os pesquisadores escrevem que “os termos criptoativo e token podem ter significados diferentes dependendo do contexto em que são usados. Os reguladores, portanto, enfrentam vários desafios: primeiro, entender as nuances dos diferentes termos, segundo, identificar a terminologia mais adequada para seus objetivos regulatórios e, finalmente, definir a terminologia com clareza e garantir que ela seja usada de maneira consistente nas declarações oficiais.”
Os Bancos Centrais e reguladores pelo mundo estão discutindo possíveis padrões de usabilidade dos criptoativos ou ativos digitais. A intenção das autoridades é promover segurança jurídica a partir da conceituação (taxonomia) de um padrão global para facilitar as definições de transações e proteção do consumidor-investidor contra eventuais ofertas públicas travestidas de ICOs, sigla para Initial Coin Offering, como são chamadas as ofertas iniciais de moedas ou ativos virtuais. Por essa razão, em julho de 2019, a Financial Conduct Authority (FCA), autoridade do Reino Unido que supervisiona condutas no mercado financeiro, publicou o seu Guia para criptoativos, onde definiu os seus primeiros limites e contornos de investigação e supervisão de mercado em relação a esse tipo de ativo.
No Brasil, tanto o Banco Central (BCB) quanto a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiram alertas públicos chamando a atenção de consumidores para o risco de investimento no mercado de criptoativos. A Receita Federal (RFB) editou a Instrução Normativa nº 1.888, de maio de 2019 (IN 1888/19), que definiu o entendimento do órgão sobre criptoativos e as atividades das exchanges no Brasil, impondo aos contribuintes a obrigação fiscal de reporte de operações com o objetivo de monitoramento de ganhos de capital envolvendo transações com criptoativos. Neste aspecto em particular, vale mencionar o caso de um Tribunal norte-americano, que no final de 2016, autorizou a Receita Federal dos EUA a ter acesso à movimentação da “carteira virtual” de um cliente em uma “caixa de troca” de moedas virtuais.
Seguindo uma orientação do Fundo Monetário Internacional (FMI), o BCB adicionou o monitoramento do volume transacionado com criptomoedas no balanço de pagamentos desde 2019. Ao final de 2022, a CVM publicou o Parecer 40, numa primeira leitura a respeito da discussão sobre caracterização e natureza jurídica de valores mobiliários na figura de ativo virtual. E no último dia 7 de fevereiro, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) julgou o primeiro caso de ICO no Brasil. O ICO da Iconic, de 2018, foi considerado um investimento coletivo irregular, sem o devido registro perante a CVM. Já a conduta do administrador responsável pela operação, apesar da não consulta à CVM, como o projeto seria inovador, a relatora do caso na reguladora não identificou dolo ou má-fé, votando pela conversão da pena pecuniária para uma advertência.
Para fins de prevenção à lavagem de capitais no segmento cripto, o FATF/GAFI tem publicado série de novas recomendações, que indicam a necessidade de aplicação por diversas jurisdições da uma análise baseada em risco para confecção de legislações nacionais pensando no crescente mercado de criptoativos. A base das orientações do GAFI tem dois pilares centrais: definir criptomoedas ou criptoativos como “ativos virtuais (“VAs”)” e os provedores de serviços de ativos virtuais (“VASPs”) como os players integrantes da Criptoeconomia.
Taxonomia de Criptomoedas
No final de 2019, o BIS lançou consulta pública para receber comentários e sugestões pelo mundo afora sobre possível regulação prudencial do mercado de cripto: “Designing a prudential treatment for crypto-assets”. A Blockchain Academy Brazil, uma empresa especializada em consultoria e treinamento sobre o tema, fez um diagrama intuitivo sobre o processo de regulação prudencial para criptoativos, que o leitor pode acessar clicando aqui. [1]
Uma compreensão das definições de criptoativos a partir de sua usabilidade é fundamental para que se possa estabelecer um programa efetivo de prevenção à lavagem de dinheiro. A usabilidade do ativo digital é uma peça essencial para a materialização de um Know Your Transaction (KYT) para fins de definições de tipologias com o objetivo de notificações de operações suspeitas às Unidades de Inteligência Financeira.
Legislação de Cripto no Brasil
Entre 2010 e 2021, um Bitcoin passou de US$ 0,39 para aproximadamente US$ 66 mil, em 20 de outubro de 2021. À medida que o Bitcoin acessa os principais mercados como um “investimento alternativo” versus taxas de juros mais baixas nos mercados de capitais, abordagens regulatórias, requisitos de licenciamento e aplicação da lei ocorrem em todo o mundo.
No Reino Unido, o judiciário lançou consulta pública sobre definições sobre criptoativos, redes DTLs, contratos inteligentes, entre outros. A consulta buscou antecipar ações judiciais sobre imprecisões e imprevisibilidade envolvendo o mundo digital e suas relações contratuais. A FCA anunciou em outubro de 2020 que seria a autoridade responsável por supervisionar as trocas naquela região.
Nos Estados Unidos, os ICOs de 2017 e 2018 chamaram a atenção das autoridades como sendo de alto risco de fraude no ecossistema por conta da falta de regulamentação.
No Brasil, a XIIIº Reunião Plenária da ENCCLA (um fórum permanente que reúne diversos entes na definiçao de estratégias de combate à corrupção e à lavagem de dinheiro) expressou suas primeiras preocupações com o tema dos criptoativos, quando recomendou que “seus participantes prestassem especial atenção às operações que envolvem esse meio de pagamento”.
Em 2017, foi criado o glossário com termos relacionados a moedas virtuais; e o levantamento de tipos de lavagem de dinheiro e corrupção utilizando moedas virtuais e meios eletrônicos de pagamento. No ano seguinte, durante a XVº Reunião da ENCCLA foi instituída pela “Ação 8”, a realização de estudos sobre o uso de moedas virtuais para fins de lavagem de dinheiro. Uma das consequências desses estudos foi a proposta de emenda à Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, com foco nos ativos virtuais; na adoção de expedientes para iniciar a elaboração de uma coleção de jurisprudência sobre o tema dos criptoativos. Já em 2019, a Reunião Plenária da ENCCLA, a “Ação 8” evoluiu seu escopo para “estudos sobre o uso de ativos virtuais para fins de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, apresentando levantamento de boas práticas relacionadas à investigação de crimes em diversas esferas; possível proposta de adequação regulatória em questões investigativas e processos criminais. Essa mesma plenária gerou outros resultados, como a elaboração de um “Roteiro de Melhores Práticas Relacionadas aos Criptoativos”; solicitação/consulta ao IBGE/CONCLA para o estabelecimento de uma classe ou subclasse da CNAE para “corretoras cripto” e/ou exchanges cripto; e o desenvolvimento do padrão de notificações de operações suspeitas a ser cumprido por corretoras e/ou exchanges brasileiras de criptomoedas. Por fim, em 2020, na XVIIº Reunião Plenária da ENCCLA, a “Ação 8” indicou como objetivo “preparar um diagnóstico sobre as possibilidades de uso de tecnologias como blockchain no setor público”.
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