O mercado brasileiro, mais estruturado e tradicional, está bastante ciente da importância e do valor dos programas, políticas e treinamentos de “compliance”, especialmente em relação à alta gerência, para que os profissionais estejam não apenas cientes, mas também sempre atualizados e bem treinados. Essa consciência e maturidade decorrem da percepção de que o mundo corporativo envolve não apenas oportunidades, mas também riscos, incluindo alguns, como o reputacional, que podem levar à destruição de valor.
Ocorre, porém, que nem todos se dão conta de que a área é extremamente dinâmica e constantemente se adequa, atualiza, e amplia, fazendo com que ela não apenas “não pare nunca”, como também precise manter, pelo menos, o mesmo espaço, e a mesma relevância na agenda corporativa – de forma permanente.
Se há cerca de 20 anos essa questão era nova e ainda era necessário explicar o significado do “compliance” e a sua importância, o desafio atual é mais focado em demonstrar às organizações que o tema não acabou/passou e continua sendo super importante. Frequentemente, vemos organizações em que a alta gerência, sempre preocupada com custos, questiona se o “compliance” ainda é necessário, ou se o que já foi realizado na empresa seria suficiente. Nessa linha, questionam se as áreas, e suas estruturas e orçamentos poderiam ser, ao menos, reduzidos.
Nosso desafio, nesse sentido, é conseguir responder que esse dilema ou essa dúvida são importantes, mas que no caso do “compliance” não se sustentam, e são muito perigosos, de forma que temos que combatê-los. Inclusive, o mercado costuma comentar (ironicamente) que se a área de “compliance” for considerada cara, muito mais cara “é não tê-la”.
Naturalmente, precisamos estar sempre atentos ao aumento da eficiência e ao melhor uso de recursos, mas temos que manter em mente que o “compliance” é investimento, ajuda a manter a integridade, e reduz o impacto negativo dos riscos, melhorando a organização, tornando-a mais segura e valiosa – gerando dinheiro ao evitar perdas enormes. Ou seja, continua sendo extremamente necessário e importante, precisando ser constantemente reavaliado e modernizado.
Adicionalmente, temos que lembrar a todos que as pessoas mudam, as organizações mudam, a legislação e a jurisprudência mudam, sendo fundamental atualizar sempre, e manter a equipe toda bem treinada. Se as organizações que já investiram na área e já criaram seus programas, e suas equipes, estão de parabéns, é preciso que elas entendam que os primeiros passos, embora fundamentais e super importantes, foram “apenas o começo”.
Como as organizações são dinâmicas, com alterações na formação do capital, nos blocos de controle e no painel de executivos, do ponto de vista interno, além de frequentes alterações em cenários e na sociedade em geral, torna-se necessário que as equipes de “compliance” estejam sempre recordando à alta gestão acerca da fundamental importância de se manter e fortalecer a área, atualizando tudo o que for preciso.
O mundo corporativo é muito rápido, com alterações constantes, e há novidades que surgem a todo momento; e com isso, surgem e se ampliam as oportunidades, mas também os riscos. Se destacarmos apenas alguns poucos riscos “relativamente novos” como o ESG, os conflitos geopolíticos que se multiplicam, as restrições de alguns insumos, as questões ambientais e climáticas, tensões sociais, cibercrimes, “vazamentos de dados”, e a inteligência artificial, entre vários outros, já percebemos rapidamente que as matrizes de riscos das organizações agora são bem mais amplas do que antes – e continuarão sendo aprimoradas e ampliadas.
A existência e a percepção desses novos riscos adicionais naturalmente afetam o “compliance”, demandando sua ampliação e atualização. Essa questão abrange modernização e ampliação de programas e de políticas, e também dos treinamentos, em diversos aspectos, que precisam ser ampliados, aprofundados e englobar temas novos, que, como dissemos, se somam aos tradicionais.
Como uma das bases do “compliance” é a melhoria contínua e o aprendizado constante, levando ao permanente aprimoramento, é natural e necessário que tanto os programas quanto as políticas e também os treinamentos sejam melhorados periodicamente. Ao longo dos anos, os conteúdos, os formatos e as maneiras de se ministrar tais treinamentos têm evoluído bastante, e esse movimento é fundamental, pois os temas têm se tornado cada vez mais complexos, e o efetivo envolvimento das lideranças é crucial para que a cultura da integridade esteja sempre presente, e fortalecida nos aspectos corretos.
Um dos desafios é tentarmos passar mais conteúdo em menos tempo, mas o desafio da organização é manter a obrigatoriedade de todos (especialmente a alta gestão) efetivamente participarem dos programas, numa parceria fundamental e permanente. Um dos temas sempre importantes a recordar, neste contexto, é que o próprio conceito e o alcance do “compliance” têm sido ampliados, pois como mencionado acima temos observado a chegada de mais temas e aspectos a todo momento.
Para alguns, o conceito (antigo) ainda se resumiria ao combate à corrupção (tanto pública quanto privada), mas quem acompanha a área mais de perto sabe que o “compliance” abrange muito mais pontos, e se relaciona a todas as áreas e as atividades das organizações, especialmente as que tenham riscos maiores em todos os aspectos. A ampliação do conceito e do escopo do “compliance” ao longo dos anos tem demandado cada vez mais das equipes que lidam com o tema nas organizações, tanto direta quanto indiretamente, e esses profissionais têm percebido que os treinamentos precisam ser cada vez mais abrangentes e complexos; alcançando, inclusive os “terceiros/terceirizados”..
Os desafios nessa linha têm sido tanto a manutenção do tema junto às diretorias e conselhos, que em alguns casos têm corrido o risco de acreditar que a área já não seja tão relevante, caindo na tentação de reduzir equipes, estrutura e orçamento. Esse enorme erro precisa ser tanto mencionado e alertado quanto combativo, pois se as operações das organizações já envolvem diversos erros, sem o devido acompanhamento do “compliance”, o fortalecimento dos programas e das políticas, e ainda dos treinamentos, a probabilidade dos riscos se multiplicarem e ampliarem é enorme.
Chamamos a atenção para esse ponto, porque é extremamente perigoso que as organizações não revejam todo esse tema e não reforcem a presença diária do “compliance” em suas operações e práticas, seja por não entenderem os riscos, seja por economia. E destacamos, nesse sentido, o ESG, que demanda capítulo próprio nos programas, nas políticas e, notadamente, nos treinamentos.
Um ponto a destacar no tocante a esses aspectos (ESG) em treinamentos junto à alta gestão das organizações é, por exemplo, o extremo cuidado que se deve ter com as terceirizações, tanto nos aspectos contratuais em geral, quanto no que se refere a temas ambientais e sociais, tais como se tem visto com relativa frequência na mídia em casos de escândalos ligados, por exemplo, a violência, racismo, preconceitos e discriminações, trabalho análogo ao escravo, acidentes ambientais, descarte irregular, mudanças climáticas etc.
Como se sabe, tem sido comum que ao buscar custos menores, nem sempre as organizações percebam que muitas vezes esses custos (de terceiros e de fornecedores) são mantidos baixos de forma artificial, ou seja, envolvem práticas insustentáveis e falta de cuidados. As terceirizações demandam, portanto, muito cuidado, além de “due diligences” específicas, iniciais e periódicas, que não se limitam a documentos, certidões e declarações, e nem mesmo às cláusulas contratuais, tanto no que refere a serviços quanto produtos e suprimentos. E, em muitos aspectos precisam ocorrer de forma humana e presencial.
Essa questão demonstra a importância do ESG nas organizações, pois o tema é amplo e abrange aspectos internos e externos, sendo todos importantes; e todos demandando comprometimento das altas lideranças. Temos observado que a questão ESG já tem vencido algumas barreiras iniciais como as resistências que antes víamos em alguns investidores e executivos, e vemos com alegria movimentos como os da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a nossa Bolsa de Valores (B3), que estão se desenvolvendo bastante nesse sentido, inclusive para que todos tenham mais informações e se combata o “greenwashing”; e já vemos, também, tanto no mercado de capitais quanto em outras organizações fechadas que parte da remuneração variável dos principais executivos está atrelada às práticas ESG.
De outro lado, porém, apesar de vermos (de forma crescente) avaliação, remuneração e bonificação de executivos atrelados a pontos ESG (o que é positivo e necessário), ainda não vemos em todas as organizações a inclusão dos temas ESG nas políticas e nos treinamentos, o que tende a retardar a criação dessa cultura nas empresas, e tende a perpetuar resistências de alguns executivos.
Em diversas organizações, além da falta de conscientização e de treinamento específico para as equipes de suprimentos/compras, como salientamos acima no tocante a terceirizações e fornecedores (por exemplo), ainda vemos esforços de áreas como recursos humanos, ambiental e sustentabilidade sendo barrados por executivos e líderes que não lhes permitem implementar políticas básicas de ESG. E nos departamentos jurídicos, deficiências nas questões trabalhistas e contratuais.
Recebemos com frequência relatos de coordenadores de RH que se queixam, por exemplo, de não conseguirem convencer algumas lideranças de que é preciso abrir mais espaço para todos os grupos de pessoas, e fomentar o acolhimento, a diversidade e a inclusão, por exemplo. E, ainda, que cuidados com a saúde, inclusive mental, dos colaboradores (o que passa pelo estilo de liderança e graus de cobrança sobre as equipes) são parte do que agora se espera dos líderes.
Na mesma linha, vemos que resistências, semelhantes, são observadas por colegas das áreas de sustentabilidade, responsabilidade social e ambiental, de forma que o grande aliado do ESG nessas organizações, em paralelo com a governança corporativa, é o “compliance”. E não nos esqueçamos de que não adianta nem mesmo a organização manter o “compliance”, se não lhe confere o devido lugar no organograma, nas prioridades da alta gestão, no orçamento, e no efetivo dia a dia de suas operações (diretas e indiretas).
Defendemos que campanhas, palestras e ações de sensibilização sejam importantes, mas que essas precisem ser complementadas pelos treinamentos de “compliance”, que têm que passar a incluir essas questões novas/adicionais. Portanto, temos que não apenas manter, como reforçar o “compliance”, inclusive no que refere ao ESG, atualizando todo o programa, e modernizando treinamentos, para que todos sigamos alinhados com os movimentos da sociedade e do universo corporativo, que são muito dinâmicos e exigentes.
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