“A Roupa Nova do Rei” de Hans Christian Andersen.
Para quem não se lembra, nesse conto o rei foi enganado por um impostor que ofereceu ao monarca uma roupa tão maravilhosa que somente as pessoas inteligentes poderiam ver, quando na verdade, não havia roupa alguma.
O rei, em sua soberba, desfila pela cidade para que todos vejam sua roupa maravilhosa e ninguém tinha coragem de dizer que ele não vestia nada. Somente uma criança, em sua ingenuidade, teve coragem de gritar “o rei está nu.”
E o mundo corporativo com isso?
Eu consigo enumerar algumas situações bastante comuns no mundo corporativo nas quais há uma forte ligação com esse conto. Situações nas quais, por vaidade ou desconhecimento, os executivos ficam despidos, ou desprotegidos, e ninguém ousa contestar.
A nudez, nesse caso, pode ser traduzida como fragilidade, exposição excessiva ao risco, quebra de sigilo ou qualquer situação que possa ser explorada por concorrentes ou stakeholders detratores.
Por vezes, nem mesmo os responsáveis por Governança ou Compliance da empresa, profissionais dedicados a manter o rei devidamente vestido, são capazes de apontar a situação ou até identificá-la.
Relacionamentos que deixam o rei nú.
Vou colocar aqui uma dessas situações da nudez real nos tempos atuais que pouquíssima gente tem dado atenção, talvez porque estejamos tão atarefados e distraídos do que acontece no entorno que nem vejamos uma nudez nos corredores.
Falo da falta de controle ou regulação do relacionamento dos representantes da organização com as chamadas Pessoas Expostas Politicamente (PEPs).
As PEPs têm definições um pouco distintas e variam muito de setor para setor, de empresa para empresa, mas, de maneira geral, são as pessoas com algum tipo de influência em decisões políticas que possam gerar impacto na organização. Podem ser prefeitos, deputados, técnicos de agências regulatórias, profissionais de primeiro escalão de secretarias ou ministérios e assim por diante.
O relacionamento entre esses profissionais e representantes das empresas, sejam executivos, conselheiros ou acionistas, é legítimo e importante, quando feito na claridade, com transparência e dentro de conceitos éticos e legais.
Por outro lado, quando se ultrapassa a linha nesses relacionamentos, a organização assume um risco legal e reputacional enorme e que se torna um passivo, pois fica vivo (mesmo que em hibernação) por muitos anos.
Mas, porque então essa nudez?
Há alguns motivos de diferentes origens, desde a dificuldade de se mensurar e mitigar esse risco, até o fato de que é mais cômodo deixar desse jeito.
Fica inegável que, aos olhos dos gestores de reputação, governança e compliance, o tema é delicado, merece atenção e dedicação especial, uma vez que é preciso alguns passos, desde definir quem são PEPs para a organização, passando pelo mapeamento dos pontos de contato oficiais entre as partes, suas regras e até como transformar isso em materialidade na Agenda ESG.
Vestir o rei ou chamar sua atenção de que uma virada de tempo pode fazê-lo adoecer se estiver sem roupas é tarefa que nem sempre é fácil ou agradável, mas é para isso que servem as áreas de mitigação de riscos nas empresas, não é mesmo?
Artigo por: Andre Lorenzetti, consultor de relações institucionais e comunicação.
Imagem: Canva
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