As empresas não podem mais ignorar as questões de assédio e importunação sexual que acontecem em seus domínios e o Compliance precisa tratar e lidar com os casos envolvendo o tema nas empresas
O assédio, tanto moral como sexual, fez parte do cotidiano da vida das empresas por muitos anos. Era prática comum, tolerável e aceita. Só que as empresas estão inseridas no contexto de uma sociedade em transformação. E o tema do assédio ganhou as redes sociais, a mídia, as ruas, ou seja, ganhou muita voz. E o eco dessas vozes afeta diretamente a reputação das empresas.
Casos de assédio e importunação sexual são dos mais sensíveis e complexos de se lidar e investigar, mas a cada dia enfrentar a questão de frente ganha importância no ambiente corporativo. O combate à prática foi impulsionado pelo movimento #me too, que viralizou nas redes sociais do mundo todo.
Apesar disso, ainda há certo tabu em torno do assunto “assédio”, com grande espaço para conscientização no mundo corporativo, especialmente do “top management” que muitas vezes não presta a devida atenção ao tema.
Muitas empresas ainda têm dificuldade em identificar, explicar ou lidar com situações “veladas”, não definem com clareza o que pode ser entendido como “importunação” ou “assédio” ou não implementam o necessário treinamento para o tratamento do assunto dentro da empresa.
“O resultado dessa omissão é a perenização do assédio no mundo corporativo e, em alguns casos, o dano à imagem e à reputação da empresa, decorrente da inércia ou da demora na tomada de decisão e aplicação de sanções e medidas corretivas”, explica a sócia do escritório de advocacia Machado Meyer, Juliana Miranda.
Um ponto importante a ser lembrado é o custo financeiro desse dano de imagem. O Relatório Global de Fraude e Riscos 2019/2020 produzido pela Kroll, multinacional que atua na área de investigações corporativas, demonstrou que incidentes de assédio sexual trazem também um risco comercial. “De acordo com o relatório, 40% dos executivos responsáveis pelo gerenciamento de risco decidiram encerrar o relacionamento com empresas parceiras que registraram problemas ligados ao assédio sexual. Isto é, a percepção de risco foi aumentada pela possibilidade de se absorver os problemas de reputação alheios”, escreveram em um artigo as diretoras da área de Inteligência de Negócios e Investigações da Kroll, Julia Carvalho e Raquel Bianchini.
Já em relação ao risco patrimonial, a existência do assédio pode colocar a empresa no polo passivo de ações trabalhistas e cíveis/indenizações por não terem lidado com o assédio de maneira correta e assertiva. “Certamente, cada caso é único e demanda uma abordagem customizada, não se devendo generalizar. Contudo, uma denúncia de assédio geralmente tem uma carga subjetiva, sendo recomendável manter o foco na busca de elementos que esclareçam os fatos denunciados”, alerta Juliana.
Para o advogado e sócio do Guirão Advogados, Alexandro Rudolfo de Souza Guirão, a questão do assédio é mais cultural do que profissional. “Mesmo que a organização estabeleça uma comunicação efetiva acerca das práticas reprováveis, daquilo que não se deve fazer, dizer ou tolerar em matéria de assédio, ainda é muito importante que o profissional responsável pelo tratamento de denúncias relacionadas a qualquer tipo de violência à dignidade seja uma pessoa consciente e disposta a ouvir os dois lados e que saiba interpretar e aplicar as normas criadas para a prevenção e repressão desse tipo de conduta”, explica. “Se o profissional responsável pelo Compliance, ou pelo Departamento de RH, não abrir a mente para entender qual a nova demanda da sociedade sobre assédio e qualquer tipo de violência, ele pode comprometer o ambiente corporativo e, com isso causar reflexos negativos para a organização”, emenda Guirão.
O papel do Compliance
Uma forma que tem se mostrado eficiente na investigação de casos de assédio é o da abordagem multidisciplinar e cooperativa: um time composto por Compliance, advogados trabalhistas e, dependendo do caso, criminalistas, já que há condutas que também configuram crimes.
O profissional de Compliance tem o conhecimento do Código de Conduta e do funcionamento da empresa, além da expertise para conduzir uma investigação interna. Entretanto, muitas vezes o denunciante não se sente confortável em falar com um colaborador que conhece e convive com o assediador. Em outros casos, o próprio profissional de Compliance prefere não se envolver diretamente na investigação, pelo mesmo motivo. Nesse cenário, é recomendável o suporte de consultores externos, que não conhecem as partes envolvidas e poderão contribuir com uma visão imparcial sobre os fatos e com o suporte necessário à área de Compliance.
“No caso de o profissional de Compliance ser o responsável pela condução da investigação, é muito importante o envolvimento de um advogado trabalhista para analisar a questão do ponto de vista legal e para opinar sobre a medida a ser adotada em face do assediador”, lembra Juliana.
Um programa de Compliance pretende, entre outras funções, preservar a imagem da empresa, da organização e dos seus gestores. Mas, como ressalta Guirão, em se tratando de assédio de qualquer natureza, a vítima é que deve ser acolhida. “A empresa que trata o assédio como um problema seu, da organização, apenas tentando se safar da exposição e evitar afetação da sua reputação, pode mesmo se complicar! Direcionar o foco e o cuidado para a vítima minimiza o impacto reputacional. Por isso, sugiro o foco na vítima e no grupo de pessoas que podem ser (ou ter sido também) vítimas do assediador”, diz o advogado.
Clareza
Denúncias de assédio, tanto moral quanto sexual, estão no topo da lista de casos que chegam aos Comitês de Ética. E o que se nota é que ainda há uma dificuldade entre as vítimas, gestores de empresas e dos próprios agressores em entender o que assédio significa. O modo mais efetivo para diminuir a subjetividade acerca do tema é a educação, por meio de campanhas de conscientização, treinamentos e políticas específicas com definições claras sobre o que é assédio.
“Do meu ponto de vista, ainda há desinformação e desconhecimento com relação ao tema, até porque a percepção de cada um sobre o que é ou não assédio pode ser bastante diferente”, explica Juliana.
Consultora e advogada especialista em Compliance e Regulação, Rosimara Vuolo acredita que ainda existe dificuldade entre as vítimas, gestores de empresas e dos próprios agressores em entender o que assédio significa. “Principalmente no assédio moral, pela ausência de legislação específica, há um arcabouço regulatório ao qual conseguimos configurá-lo. A falta de testemunhas quando da ocorrência do fato é outro agravante, uma vez que o agressor normalmente age a portas fechadas, ou seja, sem a presença de testemunhas que possam relatar o fato”, explica. “Somando-se a ausência de testemunhas com culturas machistas da sociedade, é nítido que o resultado de uma investigação de assédio sexual tem grandes chances de não proceder pela ocorrência do fato”, lamenta. Para ela, as empresas precisam, em primeiro lugar, saber diferenciar entre conflito e assédio moral, “Saber como o assédio se desenvolve e como ele realmente se caracteriza, é essencial para embasar uma administração eficaz dos casos dentro da empresa”, conclui.
Um bom exemplo da falta de clareza sobre o tema é a ideia de que o assédio moral está restrito as situações em que há tom de voz elevado ou xingamentos. Casos de pressão psicológica, humilhação pública, ofensas constantes e veladas à autoestima do funcionário muitas vezes não são percebidos como assédio moral por dirigentes, agressores e, muitas vezes, nem pela própria vítima. Ainda existe certa dificuldade em entender, por exemplo, que pode haver assédio moral tendo uma comunicação 100% por e-mail ou chat. Em tempos de home office, isso tem que ser ainda mais informado.
Nem sempre explícito
No caso do assédio sexual, a sua forma “bruta” é percebida mais facilmente. Contudo, às vezes ignora-se o assédio sexual contido naquele apelido constrangedor (“princesa”; “lindinha etc.), assim como o toque inoportuno durante uma conversa (pegar na mão ou no braço sem necessidade, inclinar-se para ficar próximo da pessoa com quem se fala etc.). Esse tipo de conduta acaba não tendo tanta visibilidade e ainda é percebida pelo assediador como uma brincadeira. A própria vítima muitas vezes se confunde e trata a situação como uma “brincadeira de mau gosto”.
São situações que acabam por inibir denúncias, já que muitas vítimas ficam com receio de compartilhar algo que elas acreditem que pode ser considerado como “irrelevante”, ou até como “implicância”, embora a situação lhes seja desconfortável. “Na minha experiência em investigações de assédio, percebo que os próprios agressores às vezes não têm plena ciência de que as suas ações configuram assédio”, pontua Juliana. “Desse modo, tanto os agressores como as vítimas tomam conhecimento sobre o enquadramento das condutas, encorajando a vítima a denunciar e desencorajando o agressor a continuar praticando o assédio”, diz.
Na opinião pessoal da Lead Compliance Counsel Latin America na Nokia, Gabriela Roitburd, assuntos relacionados a assédio são comumente liderados pela área de Recursos Humanos, mas com o suporte do Jurídico e também de Compliance, pois o assunto é delicado e requer muito preparo das pessoas envolvidas na apuração e eventual imposição de disciplina. “A presunção de inocência é algo importantíssimo aqui, pois podemos estar diante de situações como a do mau uso dos canais de denúncia. No início desse ano, quando entrevistei alguns colegas de profissão para escrever um artigo sobre assédio, um deles relatou ter vivenciado em sua empresa um caso em que a subordinada de um diretor sênior, altamente respeitado e de origem nipônica, o acusara de assédio. Ao final das investigações, ficou constatado que a moça havia inventado a história do assédio aparentemente por cobiçar o cargo do referido diretor que, arrasado, chegou a pensar em suicídio – ao final ele pediu demissão e a moça jamais assumiu o cargo almejado”, exemplifica.
“Por outro lado, tomei conhecimento de casos em que a empresa acoberta desvios de comportamento a depender da senioridade do assediador, como em um caso igualmente relatado por outro colega de profissão. Nesse, o diretor (que era casado) teria violado a política da empresa ao se envolver romanticamente com sua secretária, ameaçando-lhe de não a efetivar, caso revelasse a relação amorosa e lhe dando garantias de que ela não seria demitida. Por uma determinação da matriz estrangeira desconhecida pelo diretor, a moça fora demitida dois anos após o início da relação com o mesmo. Ela ajuizou uma reclamação trabalhista alegando, entre outras coisas, ter sofrido assédio sexual e a empresa acabou propondo-lhe um acordo: havia rumores de que outras moças teriam sofrido o mesmo tipo de assédio, pelo mesmo diretor, o qual fora repatriado para seu país de origem. Ambos os exemplos mostram situações complexas nas quais as empresas precisariam ter pessoas independentes e muito bem treinadas e capacitadas para tomarem decisões”, relata Gabriela.
Na maioria das vezes, as vítimas normalmente vivem um grande conflito interno por se sentirem inseguras sobre que rumo o assunto tomará caso denunciem. É nesse momento que as empresas precisariam se posicionar de maneira mais forte, deixando claro que não toleram qualquer forma de retaliação para as denúncias feitas de boa-fé e que as investigações serão conduzidas de forma respeitosa e confidencial.
Capacitação
A qualificação dos profissionais da área de Compliance é fundamental para lidar com as denúncias de assédio, tanto moral como sexual. Ferramentas que auxiliem na identificação de condutas assediadoras são essenciais, além de capacitação específica para lidar com pessoas assediadas, já que denúncias dessas natureza costumam vir com uma carga de trauma e estresse, demandando do profissional calma e empatia para conduzir a situação. Afinal, é preciso não “exigir” demais da vítima, mas, ao mesmo tempo, é preciso obter elementos suficientes que embasem uma denúncia. Na sequência, deve haver um procedimento a ser seguido para a devida investigação dos fatos e consequente efetividade da reposta institucional.
É recomendável ministrar treinamentos periódicos aos gestores da empresa, para que sejam capazes de identificar casos de assédio, inclusive quando a conduta do agressor é mais velada, e ainda fiscalizar suas respectivas áreas. “Tais ações conferirão maior segurança ao denunciante e à própria empresa, além de possuir um efeito preventivo, na medida em que expõe as inequívocas consequências para aqueles que praticarem assédio”, pontua Juliana.
O assédio também exige uma conscientização sobre os riscos jurídicos envolvidos. Caso a violação ocorra dentro da empresa e mesma não adote medidas para prevenir a ocorrência, ou mesmo se ignorar o fato, a empresa pode sofrer as consequências jurídicas da violação, já que é responsável pelos atos de seus funcionários (por previsão legal do art. 932, III do Código Civil). “O fator mais importante, acredito, não se alcança com treinamento: empatia! Ou seja, saber se colocar no lugar do outro, é o elemento mais importante para quem vai tratar de uma denúncia de assédio. Não devemos julgar ou querer encontrar justificativas para a violência. O mais importante é se colocar no lugar do outro”, pondera Guirão.
Divulgar ou manter o caso restrito?
A partir da definição no Código de Ética ou em algum documento oficial da empresa, que explique de forma clara e objetiva o que é assédio moral e sexual, pré-estabelecendo sanções em caso de descumprimento, é recomendável que as penalidades passíveis de serem aplicadas em casos de violação sejam expressas e divulgadas a todos, inclusive com a informação de que, além das punições realizadas pela própria empresa, o assediador poderá ser processado judicialmente. Dessa forma, quando houver a comprovação do assédio, tanto a vítima quanto o agressor já terão prévia ciência do que poderá ocorrer.
Juliana Miranda, lembra que não é praxe a empresa divulgar o resultado das investigações internas aos colaboradores nos casos de assédio – moral ou sexual – e tampouco em caso de quaisquer outras violações ao Código de Conduta. E quando se trata da comunicação ao mercado, expor questões internas da empresa, bem como seus funcionários, não irá necessariamente contribuir para a resolução da questão como poderá criar um problema ainda maior para a empresa por expor seus colaboradores – tanto o assediador quanto o assediado – pública e desnecessariamente.
“Acredito que a divulgação do resultado da investigação não seja a melhor solução. Os casos de assédio demonstram que há necessidade de ajustes em todos os níveis e áreas da empresa, de modo que apenas informar que o incidente aconteceu, expondo os envolvidos e a reputação da empresa pode não contribuir para atingir a raiz do problema, que pode ser a cultura corporativa”, pondera Juliana. “Sem falar que, por uma questão de isonomia, não deverá haver a seleção de quais casos divulgar, mas sim a comunicação de todos os casos semelhantes que ocorrerem. Essa abordagem poderá abrir um precedente levando a uma superexposição da empresa, inclusive com perdas financeiras, sem que a exposição signifique, necessariamente, uma forma de evitar a ocorrência deste tipo de caso”, lembra a sócia do Machado Meyer.
É preciso que a finalidade precípua do programa de Compliance esteja clara para todos: prevenir que violações ocorram e não a de “fazer justiça”. Por isso, com relação ao investigado/acusado, a punição deverá ser aplicada de acordo com a gravidade da conduta, variando desde uma advertência, suspensão ou até mesmo uma demissão de justa causa. Para essa avaliação também é recomendável que os profissionais de Compliance tenham o auxílio de um advogado trabalhista.
Para Rosimara, não há uma regra absoluta e cada caso deve ser analisado individualmente. “Como resposta ao assédio sexual, caso seja concluído pela procedência de sua ocorrência, o agressor deve ser imediatamente desligado da empresa, com fulcro no artigo 482 e 483 da CLT. No entanto, acredito que esta punição ocorrerá somente após deliberação dos membros efetivos do Comitê de Compliance que decidirão, com base na investigação apresentada pela equipe de Compliance, pela procedência ou não do assédio sexual”, diz.
Guirão acredita que há muita confusão sobre o que é assédio e o que não é. No entanto, há um elemento subjetivo importante no assédio de qualquer natureza e isso não pode ser desprezado: aquele sentimento que só a vítima sentiu, a afetação da sua dignidade como pessoa. “Nós temos definições objetivas do que é assédio sexual e importunação sexual no Código Penal, temos uma definição muito clara do que é assédio moral consolidada na nossa jurisprudência e, ano passado, a OIT – Organização Internacional do Trabalho apresentou outra definição um pouco mais abrangente do que nossos tribunais aplicam”, ressalta.
As organizações podem adotar o conceito mais amplo de assédio, considerando como tal qualquer violação e afetação da dignidade da vítima, mesmo que a conduta do assediador não se enquadre perfeitamente na norma ou na interpretação da jurisprudência. Porém, para Guirão, a organização que trabalhar apenas com o conceito legal, que é mais restrito, está arriscando demais. “Eu prefiro e recomendo sempre que a política contra assédio e discriminação tenha como base as definições legais, mas que também trate os casos que não se enquadrem perfeitamente nas normas, inclusive para educar e comunicar a vítima, o denunciante e o próprio acusado do assédio, este para que saiba das consequências que pode sofrer se persistir naquela prática reprovável”.
Papel estratégico
A orientação do Compliance tem um peso maior ou menor, dependendo de fatores diversos como a estrutura do departamento na empresa e o envolvimento e conhecimento que o Compliance tem do caso e dos resultados da investigação interna.
De qualquer forma, é o Compliance que gerencia o canal de denúncias. Isso dá aos gestores da área uma posição privilegiada para opinar a respeito da reiteração da conduta, intensidade ou forma do assédio e a percepção que se tem acerca do tema internamente.
O departamento Jurídico – tanto interno quanto externo – também costuma ter papel de protagonista nas recomendações da sanção a ser aplicada ao colaborador, tendo em vista a visão dos possíveis desdobramentos legais que essa decisão pode acarretar para a empresa. A decisão final é da alta direção, mas recomendações da área de Compliance, ou de um comitê, bem como dos assessores jurídicos internos e externos são fundamentais para nortear o processo decisório e auxiliar a tomada de decisão com relação à medida a ser tomada contra o colaborador que praticou a violação.
“No caso específico de assédio, é fortemente recomendado que Compliance também seja envolvido em eventuais discussões sobre como a empresa deve se posicionar, avaliar os pros e contras de cada ação antes de a empresa implementá-la”, lembra Gabriela. “Em relação ao peso de decisão das áreas de Compliance nessas situações, dependerá muito da maturidade do programa de Compliance de cada empresa e do famoso “tone from the top”. No final do dia, as empresas deveriam pensar com cautela em que tipo de mensagem querem passar tanto ao seu público interno como ao externo”, diz a executiva da Nokia.
Entender o papel do Compliance nesse cenário é fundamental, porém complexo, uma vez que a área nunca é a responsável pela “palavra final”, e sim a que orienta e recomenda medidas a serem adotadas. No entanto, cabe à direção da empresa ou a outra área a decisão de punir, mandar embora ou até mesmo execrar publicamente.
O maior problema, como aponta Girão, é que a grande maioria das empresas no Brasil ainda não tem área de Compliance. E mesmo as que têm, provavelmente concentram (ou dividem) o tratamento do tema com a área de RH. Daí a decisão, mesmo orientada, nem sempre é aquela que a área de Compliance entende a melhor. “Uma coisa é certa: qualquer que seja a solução, o desdobramento, deve ser único. Deve existir uma uniformização nos procedimentos e não haver flexibilidade ou mudança de atitude a depender do cargo ou da posição do assediador ou da vítima. Se o assediador é um alto executivo ou um par/colega de mesmo nível hierárquico da vítima, isso não deve afetar nas decisões, sob pena de descrédito da empresa e comprometimento do ambiente”, pondera. “A empresa não deve incentivar a execração pública, pois esse não é seu papel. E deve se posicionar sobre isso, para que não pairem dúvidas da sua postura. As denúncias falsas devem ser punidas. Denunciante de má-fé não merece esclarecimento. Se for identificado, deve ser punido. O problema é que muitas denúncias falsas são anônimas”, alerta Girão.
A questão das falsas denúncias é um problema que afeta não apenas o âmbito empresarial, mas também a seara criminal. É notório que o assédio – principalmente o sexual – geralmente não deixa vestígios, principalmente se for praticado apenas oralmente e sem testemunhas. Daí decorre a importância e o peso que se dá à palavra da vítima. “O papel da empresa não é de fazer justiça, mas zelar pelo ambiente de trabalho e por uma cultura livre de assédio na empresa, desprendido de expectativas ou anseios específicos”, complementa Juliana Miranda.
De qualquer forma, falsas denúncias, assim como denúncias verdadeiras, só podem ser identificadas após a devida investigação. Casos de assédio costumam causar comoção, mas é importante manter a serenidade e imparcialidade, sem fazer juízos de valor precipitados ao conduzir uma investigação.
Fato é que as empresas não podem mais ignorar as questões de assédio e importunação sexual que acontecem em seus domínios e o Compliance costuma ser a área responsável por tratar e lidar com casos envolvendo assédio nas empresas. Isso torna necessário que os profissionais da área “mudem a chave” ao tratar do assunto, para tentar quebrar vieses, reavaliar a forma como as pessoas se relacionam entre si e a postura e a prática dos líderes das empresas em relação ao tema.
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Publicado originalmente na edição 30 da revista LEC com o título “Setor em transformação”.
Imagem: Freepik