A prática do lobby é constantemente associada a atividades ilícitas – como a corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência – pela sociedade civil e mercado em geral. No Brasil, o viés pejorativo em relação ao lobby é impulsionado por questões culturais, ausência de regulamentação legal sobre a matéria e o histórico de escândalos de corrupção relacionados a atividades de lobby, a exemplo de esquemas alegadamente praticados no âmbito da Operação Lava Jato.
Entretanto, o lobby, por si só, não deve ser confundindo com práticas ilícitas. Diversos estudos destacam o papel legítimo do lobby na democracia moderna ao permitir que grupos de interesses tenham representatividade na tomada de decisões governamentais e no processo político em geral, considerando o lobby como um corolário do direito constitucional de petição.
Os Estados Unidos foram o primeiro país a regulamentar o lobby com a aprovação do Federal Regulation of Lobbying Act em 1946, que foi substituído pelo Lobbying Disclosure Act em 1995, posteriormente emendado pelo Honest Leadership and Open Government Act em 2007. Diversos outros países também já outorgaram legislação para regulamentar a prática do lobby, como o Reino Unido, França, Alemanha e Áustria. No Brasil, o lobby ainda não foi regulamentado e o tema é objeto do Projeto de Lei nº 2.914/2022, atualmente em trâmite no Senado Federal após ser aprovado pela Câmara dos Deputados quinze anos depois da apresentação do Projeto de Lei em 2007.
Sob a perspectiva do compliance anticorrupção, a ausência de regulamentação do lobby no Brasil aumenta significativamente os riscos para as empresas que utilizam terceiros intermediários – como associações ou agentes – para interagir com agentes públicos e influenciar decisões governamentais, diante da inexistência de regras claras definindo a forma, os requisitos e limites das interações entre agentes públicos e privados no contexto institucional. Tais riscos são potencializados pelo histórico recente de ações de persecução conduzidas por autoridades anticorrupção contra empresas envolvidas na prática ilícita do lobby. Por exemplo, em setembro de 2022, a Gol Linhas Aéreas Inteligentes S.A. (GOL) celebrou, simultaneamente, um Acordo de Leniência com a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU) e um Deferred Prosecution Agreement com o Department of Justice (DOJ) e a Securities and Exchange Comission (SEC) dos Estados Unidos no valor total de aproximadamente USD 41 milhões, em razão do pagamento de propinas a agentes públicos no Brasil que resultaram na promulgação de duas leis favoráveis à GOL, que reduziram impostos sobre folha de pagamento e preço de combustível.
A despeito da ausência de regulamentação no Brasil, um Programa de Compliance robusto oferece mecanismos que podem mitigar riscos relacionados à prática do lobby. Embora a CGU e outras agências anticorrupção estrangeiras – como o DOJ, a Serious Fraud Office (SFO) do Reino Unido e a Agence Française Anticorruption (AFA) da França – não tenham diretrizes de compliance específicas para o controle de atividades de lobby, possuem diretrizes bem definidas em relação às atividades de terceiros intermediários em geral que podem ser utilizadas para mitigar os riscos da prática do lobby. A título exemplificativo, os seguintes controles de compliance podem ser aplicados, a depender dos riscos identificados caso a caso, em relação a terceiros contratados para desempenhar o lobby:
- Procedimento de Due Diligence reforçado (Enhanced Due Diligence) previamente à contratação do terceiro;
- Estabelecimento de cláusulas contratuais que definam claramente o escopo da prestação dos serviços e delimitem a atuação do terceiro;
- Previsão de cláusulas anticorrupção robustas;
- Estabelecimento de controles nas interações entre o terceiro e agentes públicos;
- Regras restritivas quanto ao oferecimento de brindes, presentes e hospitalidade, bem como de doações ou patrocínios de qualquer natureza;
- Monitoramento contínuo dos serviços prestados pelo terceiro; e
- Fixação de remuneração com base em honorários desvinculados ao êxito na prestação dos serviços.
Portanto, a regulamentação do lobby no Brasil – com a definição de regras claras para a atuação do setor privado no processo de tomada de decisões governamentais –, somado à implementação de Programas de Compliance robustos pelas empresas, se mostra como um caminhado adequado para a mitigação de riscos da prática lícita do lobby no Brasil. Tais fatores, embora não eliminem os riscos do lobby, possibilitariam ao setor privado participar na tomada de decisões governamentais com maior segurança jurídica e integridade, de maneira a mitigar riscos de responsabilização no âmbito da Lei 12.846/2013 e outras legislações anticorrupção nacionais e estrangeiras, bem como riscos reputacionais.