Pela primeira vez um diretor de compliance de banco é multado, em US$ 450 mil, por não evitar lavagem de dinheiro.
Na última conferência AML & KYC Banking Summit para a América do Norte 2021, compartilhei com o público as recentes medidas de aplicação da legislação antilavagem de dinheiro (AML) nos EUA que podem impactar os profissionais de compliance da América Latina.
Há uma nítida tendência de imputar a aplicação da legislação antilavagem de dinheiro aos profissionais de compliance. A Rede de Fiscalização de Crimes Financeiros (FinCEN), autoridade reguladora americana, impôs uma multa civil no valor de US$ 450 mil a Michael LaFontaine, ex-diretor de riscos operacionais do U.S. Bank NA, pela suposta omissão em evitar violações previstas na legislação de sigilo bancário e lavagem de dinheiro (BSA/AML) cometidas durante sua gestão, compreendendo deficiências no sistema de monitoramento de software do banco, escassez de pessoal de compliance e outras falhas no combate e prevenção à lavagem de dinheiro.
Foi a primeira multa aplicada a um diretor de compliance de um banco, mas podemos esperar mais casos como este. As autoridades reguladoras federais dos EUA estão intensificando a fiscalização do cumprimento das obrigações da Lei de Sigilo Bancário e Antilavagem de Dinheiro pelas empresas e, ao que tudo indica, o ano de 2021 verá um recorde de sanções. Só no primeiro trimestre de 2021, os reguladores já impuseram mais de US$ 200 milhões em sanções a pessoas jurídicas.
Aplicada após uma resolução sobre BSA/AML do U.S. Bank em conjunto com a FinCEN, o Departamento de Justiça dos EUA, a Controladoria da Moeda (OCC) e o Federal Reserve, essa medida com multas que somam US$ 613 milhões marca a primeira vez que a FinCEN penaliza um diretor de compliance de banco por faltar com o dever de evitar falhas no programa de compliance BSA/AML.
A medida vem na esteira de várias medidas fiscalizatórias recentes da OCC contra executivos de instituições financeiras. Dentre elas estão os termos de ajustamento de conduta da OCC com John Stumpf, ex-CEO e presidente da Wells Fargo, e mais dois ex-executivos, em janeiro de 2020, e as medidas fiscalizatórias contra outros cinco ex-executivos da Wells Fargo, incluindo o diretor de risco, o diretor jurídico, o auditor-chefe e o diretor executivo de auditoria do grupo.
No termo de ajustamento de conduta, LaFontaine foi obrigado a declarar que não exerceu funções de gestão de compliance em nenhuma instituição financeira desde que deixou o U.S. Bank, em junho de 2014. Somada às recentes medidas da OCC, a medida da FinCEN contra LaFontaine sinaliza uma tendência de esforços mais agressivos por parte dos reguladores federais para responsabilizar pessoas físicas por falhas de compliance nas instituições financeiras onde elas atuam.
Na imposição de multa civil a LaFontaine, a FinCEN concluiu que ele:
- falhou em tomar as providências cabíveis para dotar a divisão de compliance do U.S. Bank com pessoal adequado para atender às expectativas regulatórias; e
- falhou em tomar as medidas cabíveis ao ser informado sobre as graves falhas do programa de BSA/AML. A FinCEN alega que LaFontaine recebeu alertas do pessoal de AML do U.S. Bank, mas não lhes deu a devida atenção.
O Diretor de Compliance admitiu seu papel nas violações de BSA/AML do U.S. Bank, que se deu inclusive na forma de:
- omissão em implantar um sistema de monitoramento de transações adequado para detectar atividades potencialmente suspeitas;
- omissão em alocar recursos adequados ao programa de AML do U.S. Bank e, consequentemente,
- omissão em apresentar tempestivamente milhares de relatórios de atividades suspeitas (“SARs”), inclusive sobre transações que poderiam gerar lavagem de valores oriundos de crimes.
A condenação de LaFontaine reforça a importância de que os supervisores de programas de compliance BSA/AML atendam às expectativas regulatórias, inclusive procurando garantir que:
- recursos suficientes sejam alocados para as atividades de compliance BSA/AML e
- os sistemas de monitoramento de transações sejam devidamente calibrados para detectar transações potencialmente suspeitas com base no risco, e não no volume. Além disso, os diretores de compliance devem encaminhar rapidamente os alertas relevantes que venham a receber sobre a adequação dos programas de BSA/AML, para que eventuais problemas graves sejam prontamente corrigidos conforme a necessidade e as circunstâncias.
Não são apenas bancos e instituições financeiras que estão sujeitos a estas obrigações. Em maio de 2020, o Federal Reserve Bank teria emitido um boletim preconizando um exame mais detalhado para apurar se os fundos de investimento privados possuem programas de compliance AML adequados. Embora tenha declarado que instituições de caridade e entidades sem fins lucrativos não são consideradas de alto risco para a lavagem de dinheiro, a FinCEN também relembrou que tais instituições têm a obrigação de manter salvaguardas AML adequadas.
Este é um momento propício para as instituições financeiras reverem se suas políticas e procedimentos AML fornecem proteção efetiva ou se precisam de atualização para reduzir os riscos corporativos.
Artigo por Werner R. Hospinal, Vice-Presidente, Diretor de Compliance BSA/AML e Gerente de Auditoria na Plus International Bank
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