A carreira de Compliance vem ganhando crescimento exponencial em nosso país, e a procura por candidatos com um conjunto diverso de habilidades aumenta a cada dia. Companhias de todos os ramos e tamanhos precisam rapidamente se adequar às regras sem grandes conflitos internos de mudança de cultura, em um mundo digital que se transforma a cada instante.
Existem algumas habilidades essenciais para que um executivo de Compliance possa trazer prosperidade aos processos de sua empresa, com uma abordagem integrada sobre os problemas enfrentados no dia-a-dia. Não é sustentável um posicionamento onde apenas aquilo que se pode ou não se pode é ditado; isto só serviria para engessar (ainda mais) os processos.
Nesse contexto, existe um tipo de experiência que pode traduzir os conhecimentos profundos que os advogados possuem sobre a Lei em uma dinâmica inovadora, baseada em conceitos aplicados em outras disciplinas – e que pode ser um fator chave de sucesso nesta empreitada: a experiência em Gerenciamento de Projetos.
Na essência, um bom gestor é aquele capaz de: estabelecer metas relacionadas aos objetivos estratégicos de sua área, criar indicadores para medir e acompanhar tais metas, incentivar a sua equipe da maneira certa a atingir os melhores resultados, e “trocar as rodas com o veículo em movimento” – fazendo adaptações e mudanças nos processos a fim de melhorar sempre.
Um conhecedor da Lei que tenha adquirido ao longo de experiências multidisciplinares que lhe tenham agregado atributos de um bom gestor tem, sem dúvida, potencial para decolar o programa de Compliance de sua empresa de maneira eficaz e assertiva.
Mas como a aplicação de conceitos de gestão pode ser essencial para prosperar nos principais elementos de um programa de Compliance?
Diferentes manuais pelo mundo trazem inúmeros pilares sobre os quais os programas liderados pelo Gerente de Compliance de uma empresa devem se basear para garantir eficácia nos controles e máxima mitigação dos riscos.
A seguir, uma abordagem breve sobre os elementos que acredito serem essenciais para um programa de Compliance, e como a disciplina de gerenciamento de projetos pode ser um diferencial para garantir sua sustentação.
1. PATROCÍNIO DA ALTA DIREÇÃO
Pode ser desafiador conseguir um espaço na agenda apertada dos executivos para falar de Compliance. Por isso, uma governança bem estruturada passa a ser vital. Qualificar uma estratégia em “clusters” e exibir um acompanhamento de seu programa com base neles facilita a comunicação e torna as reuniões de comitê eficientes.
Por exemplo, ter 30 minutos por mês na agenda dos executivos para tratar sempre dos mesmos assuntos (como número de denúncias, principais gaps de processo, itens de comunicação, análises de cultura, entre outros) garante um maior engajamento deles, por já saberem o que esperar.
Mas lembre-se: adiantar o assunto com alguns deles se o “problema” está em uma de suas áreas é essencial para não os expor frente aos demais executivos.
2. ESTUDO DOS RISCOS DO NEGÓCIO
Uma vez que o gerente de Compliance consiga a atenção dos executivos, ele passa a ter também a sua confiança – e por isso deve monitorar quaisquer riscos que possam ferir a empresa e, de forma indireta, tais líderes.
Um profundo conhecedor jurídico conhece bem os limites entre as entregas e aquilo que se pode ou não se pode em cada área, mas é impossível garantir um bom controle daquilo que acontece na operação de uma companhia sem ter conhecimento de seus processos em profundidade. Por isso, a bagagem de alguém com conhecimento em projetos pode ajudar a acelerar a implementação de controles nos pontos de atenção comuns a todas as empresas.
3. CONTROLE NOS PROCESSOS
Controle é essencial.
É importante que, durante uma investigação, não apenas notas sejam tomadas e um questionário preparado. Controlar o número de dias em que aquele caso esteve aberto, analisar estatisticamente o número de gaps de processo ou mesmo desvios de atitude encontrados na área em questão, tudo isso enriquece um canal de denúncias. Além disso, é essencial acompanhar de perto as ações corretivas quando do encerramento de um caso – o que, por inconcebível que seja, muitas vezes não é praticado.
É papel de um gerente de Compliance provocar e acompanhar mudanças estruturais em cultura, organização, processos e sistemas para que riscos relacionados a cada um dos casos sejam mitigados em tempo hábil. Isso pode custar apenas uma planilha e algumas horas por mês.
4. TREINAMENTO & COMUNICAÇÃO
Assim que movimentações como essas começam a ser feitas, um comum desconforto vem à tona dentro de qualquer organização. Uma robusta gestão da mudança se faz imprescindível.
Facilitar a resolução das interdependências entre as áreas, promover uma clara comunicação e investir em treinamentos assertivos com conteúdo envolvente – tudo isso fecha um ciclo de implementação sustentável de um programa de Compliance ao longo do tempo, garantindo que, mesmo com um alto turnover, as pessoas que deixem a empresa não levem consigo todo o conhecimento e controle sobre os processos.
5. MONITORAMENTO CONTÍNUO
Lembre-se, elaborar indicadores ou montar um belo mapa de riscos e pontuações de performance não basta: é importante qualificar os problemas.
Suponhamos que sua companhia tenha recebido 200 ligações de consumidores reclamando do produto X, contra 300 num período anterior. Estamos falando de uma redução de 33%. Isto parece fantástico, certo? Errado. Não se pode concluir nada até entender qual o teor destas reclamações. E se 180 delas forem sobre um mesmo problema na qualidade; um problema que afete a saúde de seus consumidores?
Somente um bom relacionamento com as áreas e um interesse no valor que elas agregam como frentes de trabalho permite analisar a fundo os dados e antecipar tendências problemáticas.
Esses são apenas alguns dos valores que alguém com esse perfil inovador pode agregar à cadeira de Compliance, trazendo proatividade e contemporaneidade ao ambiente corporativo.
Ter conhecimento não apenas das mudanças externas, mas também daquilo que se passa em cada processo de sua organização, ter a confiança das pessoas, ser bem-organizado, estabelecer uma governança eficaz e engajar os executivos na mitigação de riscos: são diversas as atitudes que podem auxiliar sua empresa a alcançar patamares diferenciados na conquista por uma reputação digna da confiança de seus clientes.
DENIS AMARAL é engenheiro de formação, possui 13 anos de experiência em gestão de projetos e é Gerente Regional de Compliance na Reckitt Benckiser.
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