Um trabalho responsável de comunicação, com conteúdos precisos e bem fundamentados do ponto de vista técnico, mas em formatos acessíveis aos diferentes públicos, geram significado e impactos positivos para os negócios.
Há uma máxima em voga no mundo corporativo atual, cuja inspiração remonta ao império romano: ” não basta ser ético, é preciso parecer ético.” Para isso, é preciso se mostrar, aparecer, ser visto… Em suma, as empresas precisam comunicar em alto e bom som a aplicação prática dos seus princípios, valores e, por que não, do programa e de outras iniciativas de compliance da empresa.
São grandes os desafios que precisam ser enfrentados para fazer com que a mensagem de compliance seja entregue, compreendida e que o tema seja percebido pelos seus funcionários e parceiros, como um diferencial do negócio, e não apenas como uma obrigação.
O melhor caminho para atingir esses objetivos é apostar na objetividade, na clareza, e, sobretudo no uso de uma linguagem acessível a todos os públicos. A partir do momento em que a comunicação dos temas de compliance está alinhada ao negócio, ela tem potencial para permear a empresa e envolver os membros da equipe.
“Na Ceptis, a comunicação mereceu capítulo especial, sobretudo em termos de filosofia”, diz o CEO da empresa, Philippe Ryser. “Acreditamos que se trata mais de uma questão de princípio e conceitos do que de forma e ferramentas; e não precisamos reinventar a roda, apenas recorremos ao que Philip Kotler, o papa do marketing, formulou há muitos anos: “para a empresa ter uma imagem e reputação que provoque aderência (no sentido amplo) junto aos seus vários públicos, é preciso revisar e ajustar todos os processos de back office, para que o resultado final da companhia (produto, serviço e relacionamentos) corresponda àquela imagem projetada pelo corpo diretivo””, pondera.
Em outras palavras, significa que a comunicação deixa de ter um papel apenas no fim do processo produtivo e passa também a desempenhar papel nas etapas anteriores. Esse tratamento estrutural e estruturante da comunicação se diferencia do que geralmente as empresas buscam. Geralmente, o pensamento médio é: vamos elaborar planos de comunicação e executá-los de forma a estabelecermos uma boa imagem. “Isso não é exatamente errado, mas tornou-se insuficiente e old school nesses novos tempos”, afirma o CEO. “Em nossa filosofia, não basta uma mensagem potencialmente simpática se ela não está calcada numa verdadeira mudança da empresa em benefício de seus vários públicos. Isso vale desde o incremento de qualidade de produtos e serviços, passando pelo bem-estar de colaboradores, até o relacionamento com a comunidade e meio ambiente, e colaborações diversas junto a autoridades e políticas públicas. Estamos passando da era da publicidade-propaganda-divulgação para a era da mudança de posturas, geração de engajamento e fortalecimento da reputação como principal valor nas interações. A partir dessa premissa, qualquer ação de comunicação deve ser, em si mesma, causa ou consequência dessa transformação. A questão é sutil, mas de suma importância”, alerta Ryser.
Para o doutor em ciências da comunicação e consultor na área, Pedro Ulsen, a melhor decisão sobre estratégias de mídias deve considerar o domínio técnico da comunicação, visão transdisciplinar, habilidades de liderança e competência para gerenciar processos. “Espera-se que esse processo seja liderado por um gestor que tenha um perfil favorável e estratégico para criar narrativas, coordenar a produção de peças de comunicação, executar a curadoria de conteúdos e oferecê-los de forma adequada para que tenham significados aos públicos de interesse. É um processo sistematizado de planejamento e execução que deve ser assertivo, customizado e contínuo”, afirma.
Investir em uma comunicação inovadora, pragmática e assertiva, que seja clara ao se alinhar à estratégia da empresa como forma de gerar valor, ampliar os diferenciais competitivos e alavancar negócios é o mais indicado no cenário corporativo atual. Para que isso ocorra, é necessário que os objetivos estratégicos da organização – e no caso mais específico, os objetivos estratégicos da área de Compliance – estejam claros. Somente assim haverá o engajamento dos públicos. Como afirma a Compliance Officer da Avon, Marisa Peres, dependendo do público-alvo pode-se utilizar de formas mais lúdicas de comunicação, como gibis, vídeos interativos, pílulas curtas (tipo “mensagem do dia”) ou outros meios que tornem mais palatável, atual e acessível. “É preciso adaptar os formatos com base no perfil do público a que se direciona o comunicado, sem se apegar a um único formato ou conteúdo, e sim em algo que seja diverso e inclusive divertido, envolvente”, diz.
Também é importante que sejam implementadas alianças institucionais e inovação dos processos para que a comunicação seja mais estratégica. “O respaldo científico também é importante, pois toda ação fundamentada em pesquisas tem mais credibilidade e sucesso”, defende Ulsen.
Medindo resultados
Uma comunicação eficaz requer uma cultura organizacional favorável ao diálogo e à inovação para coexistir. Nesse cenário, a mensuração é determinante e só poderá ser atingida após a definição clara de objetivos e metas da estratégia de comunicação, ou mesmo de uma campanha criada com um objetivo específico. Além disso, é importante a criação e o monitoramento de indicadores com uma gestão que monitore os resultados e embase os processos de tomada de decisão. “Ter indicadores constantemente monitorados e utilizados para o aperfeiçoamento da gestão empresarial, como índices de confiança do consumidor, evolução dos canais de denúncia e controle documental, é cada vez mais importante”, lembra Ulsen, para quem as avaliações quantitativas, por exemplo, podem estar fundamentadas em impactos nas receitas e despesas, em métricas quantitativas e no retorno de redes corporativas. “Já as avaliações qualitativas devem estar embasadas em indicadores de qualidade, identificação de causas e efeitos, valor relativo das coisas e mensuração dos ativos intangíveis”, pontua o doutor em comunicação. Outras possibilidades válidas englobam pesquisas de clima, análises estruturadas, questionários fechados, relatórios digitais e aplicação de técnicas de investigação apreciativa. O CEO da Ceptis acredita que um dos mais efetivos instrumentos de medição de resultados é a boa e velha flexibilidade e abertura para diálogo entre os diferentes níveis hierárquicos.
Daí decorre a importância de criar bom clima organizacional para isso ocorrer, seja em dinâmicas de RH ou estímulo direto entre colegas envolvidos nas atividades de compliance. “Temos sempre a preocupação de empreender uma comunicação transparente e efetiva. Por exemplo: os colaboradores são sempre os primeiros a saber das notícias da empresa”, argumenta. “Também já utilizamos pesquisas internas, feitas com supervisão de empresas especializadas, que são muito efetivas, assim como o próprio canal anônimo de denúncias previsto no programa. Independentemente das denúncias, que possuem caráter mais crítico e desafiador, o próprio grau de feedback espontâneo do quadro de colaboradores, por e-mail é um excelente indicativo do quão à vontade e proativas estão as pessoas para se expressarem sobre o compliance e temas gerais da empresa. Nesse sentido, estamos particularmente felizes pela quantidade de feedbacks espontâneos recebidos a cada mês, de diversas naturezas: críticas, sugestões, dúvidas, elogios”, comemora Philippe Ryser.
Para Marisa Peres, medir a eficácia das comunicações de compliance é algo bem complexo. “Na Avon, temos comunicados que são enviados por e-mail, publicações na intranet e no yammer (uma plataforma interna de “rede social”). Monitoramos o número de visualizações dos posts feitos no yammer e a cada 18 meses fazemos uma pesquisa de Ética & Compliance que nos ajuda a avaliar e medir, entre outros pontos, a eficácia de nossas comunicações. Também estimulamos o cascateamento de nossos comunicados por meio dos gestores e no ano passado fizemos uma pesquisa específica com os gestores para verificar com que frequência comunicavam o tema compliance para seus times. Além disso, monitoramos os números de reportes em nossa linha de integridade. Contudo, não posso afirmar categoricamente que qualquer um desses mecanismos é capaz de mensurar a eficácia”, pondera.
No entanto, a executiva tem boas experiências internas sobre estratégias de comunicação que surtiram efeito, com o uso de ferramentas variadas, como gibis, personagens, filmes, jogos interativos, aplicativos para celular, entre outros, com uma linguagem menos jurídica e mais acessível. “É um admirável mundo novo e estamos só começando a ver o início dessa estrada. O tema ainda é muito novo no Brasil e ainda está muito focado nas questões relacionadas à criação de políticas, códigos, comunicar e treinar, mas acredito que nos próximos cinco anos teremos um avanço maravilhoso e muitos produtos serão desenvolvidos nesse sentido”, diz.
O papel dos eventos
Toda iniciativa direcionada para engajar as pessoas em processos de compliance é importante, mas elas só serão relevantes quando alinhadas com a política interna da organização e a uma visão de planejamento que preveja o mapeamento prévio de todas as variáveis comunicacionais envolvidas no processo. Somente assim os recursos serão otimizados e o impacto poderá ser mensurado.
Semanas da ética, workshops e afins criados para canal de comunicação e engajamento de pessoas nesse processo normalmente trazem resultados muito positivos. “Acredito muito e sou uma grande defensora desses eventos, pois além de aproximarem as pessoas do profissional de compliance – e mudar a imagem de ‘polícia’ que infelizmente continua existindo nas empresas – faz com que as pessoas sejam motivadas a pensar no assunto de uma forma mais interessante, muitas vezes sem nem perceber que estão falando de compliance, e ainda acabam percebendo o quanto o tema está presente em sua vida de modo geral, assim como o impacto que o ‘non-compliance’ tem na sociedade”, defende Marisa.
Tanto do ponto de vista simbólico quanto prático, ter esses momentos de reflexão incentivam o aparecimento das vozes múltiplas dos colaboradores sobre a imagem e clima da empresa. “Se o staff envolvido no compliance fizer as coisas imbuídas de verdade, as pessoas percebem que aquele investimento de energia, tempo e dinheiro implica a real preocupação da companhia com a correção e a transformação das práticas”, instiga Ryser.
Fato é que não existe receita de bolo, tampouco fórmula infalível para uma comunicação assertiva, pois é algo que tem de ser aferido no relacionamento com cada público, já que cada um tem as suas especificidades e é sensibilizado de formas variadas.
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Imagem: Freepik