Mais uma empresa fechou um acordo para encerrar processos de acusação por corrupção em múltiplas jurisdições. A companhia escocesa de engenharia John Wood Group PLC vai desembolsar US$ 177 milhões às autoridades britânicas, norte-americanas e brasileiras para encerrar acusações relacionadas à corrupção de agentes públicos praticada por terceiros relacionados com o negócio da Amec Foster Wheeler Limited (AFWEL), fabricante de equipamentos de engenharia para a indústria de óleo e gás incorporada pela John Wood em 2017.
Na verdade, as acusações estão relacionadas com condutas praticadas entre 1996 e 2014 pelo conglomerado de origem suíça Foster Wheeler, período anterior à incorporação da companhia pela Amec PLC, companhia britânica de consultoria e gestão de projetos de engenharia, em novembro de 2014.
De acordo com o John Wood, o grupo irá pagar US$ 62 milhões no segundo semestre deste ano e o montante restante entre o próximo ano e 2024. O grupo disse ter cooperado plenamente com as autoridades em suas investigações, o que está refletido nos créditos concedidos pelas autoridades em suas respectivas resoluções. A empresa também não terá, por nenhum dos três acordos firmados, que apontar um monitor de Compliance independente, mas se comprometeu a cumprir e a reportar o desenvolvimento de algumas obrigações relacionadas à área de Compliance, pelo tempo dos acordos firmados com p Serious Fraud Office do Reino Unido (SFO), o Departamento de Justiça norte-americano (DoJ) e Controladoria-Geral da União (CGU), ADVOCACIA-Geral da União (AGU) e Ministério Público Federal (MPF) aqui no Brasil.
A maior parte do valor, 103 milhões de libras (cerca de US$ 142 milhões), será paga no Reino Unido, sede da AFWEL e de sua atual controladora. O DPA firmado com o SFO, aprovado pela Justiça britânica no dia 1 de julho, cobre atos ilícitos em cinco países. Além do Brasil, tais práticas foram perpetradas na Nigéria, Arábia Saudita, Malásia e Índia. O valor pago ao Reino Unido contempla os custos do SFO com a investigação que se estendeu por quatro anos e custou 3,4 milhões de libras.
“Por 18 anos, a Foster Wheeler descaradamente e calculadamente pagou subornos a funcionários públicos em todo o mundo para cortar custos e garantir contratos, fazendo o possível para esconder sua conduta corrupta. Ao fazer isso, a empresa subverteu a regra de lei e prejudicou a integridade da economia no Reino Unido. Continuaremos a fazer justiça ao contribuinte punindo tais ações e forçando as empresas a mudar para melhor”, disse em comunicado a diretora do SFO, Lisa Osofsky.
A diretora do regulador britânico também reforçou que “justiça também significa recuperar dinheiro para indenizar as vítimas sempre que possível”. A dirigente se diz muito feliz por ter conseguido obter uma indenização para as vítimas nigerianas neste caso. A título de compensação ao povo da Nigéria de míseros 210,61 mil libras esterlinas.
Segundo as autoridades, a multa total reflete a gravidade da conduta, mas também a cooperação total da John Wood e da AFWEL e as extensas medidas de remediação e avanços no programa que foram aplicados pela companhia. O DPA de três anos prevê que a John Wood deverá reportar anualmente para o SFO sobre os avanços do grupo em relação aos seus programas de ética e Compliance.
“As investigações trouxeram à luz um comportamento inaceitável, embora histórico, que condeno nos termos mais veementes. Embora tenhamos herdado esses problemas por meio da aquisição, assumimos total responsabilidade em resolvê-los, como qualquer empresa responsável faria”, disse Robin Watson, CEO do John Wood Group PLC. Segundo ele, desde a aquisição da Amec Foster Wheeler, o grupo veio cooperando com as autoridades e tomado medidas para melhorar seu programa de ética e conformidade a partir de uma base já sólida.
O DPA britânico diz respeito apenas às implicações criminais contra a companhia. As investigações sobre a conduta de indivíduos suspeitos continuam.
Já o acordo fechado com as autoridades norte-americanas no dia 25 de junho, tem relação apenas com violações ao FCPA e a corrupção praticada pela AFWEL no Brasil entre os anos de 2011 e 2014. Pelo DPA, também com duração de três anos, o John Wood se comprometeu a pagar US$18,375 milhões para encerraras acusações de ter subornado tomadores de decisão na Petrobras em troca de um contrato de US$ 190 milhões relacionada com o desenvolvimento do Complexo Gás-Químico UFN-IV. A trama teria sido realizada em conluio com um agente de vendas italiano afiliado com uma empresa intermediária baseada em Mônaco, a notória Unaoil. O acordo também prevê que a companhia deve fortalecer a sua área de Compliance. Segundo o DoJ, a companhia, por meio de alguns funcionários e agentes, atuou para promover o esquema a partir de unidades em Nova York e Texas, e gerou pelo menos US$ 12,9 milhões em lucros com os negócios obtidos de forma corrupta. “Esse anúncio demonstra a dedicação do FBI em trabalhar com nossos parceiros internacionais num esforço global para perseguir empresas e indivíduos que acreditem na corrupção como o único modo de se fazer negócios”, disse o diretor-assistente do escritório de Washington do FBI Steven D’Antuono. Para o policial federal esse DPA deve servir de aviso às empresas de que o uso de terceiros para pagar propinas não as livrarão de serem responsabilizadas por casos de corrupção no exterior.
Para chegar à resolução, o governo norte-americano considerou a falha da empresa em comunicar de forma voluntária e rápida as condutas que determinaram a abertura das investigações e a natureza e a seriedade dos crimes, que perduraram por vários anos e envolveram um executivo de alto nível. Mas a empresa recebeu créditos por sua cooperação e por ter se engajado na tomada de medidas de remediação, incluindo o desligamento de um indivíduo envolvido na conduta e a adoção de elevados procedimentos de controles internos e combate à corrupção. Por isso, a penalidade reflete uma redução na multa aplicável de acordo com o U.S. Sentencing Guidelines. Além disso, no DPA a companhia também foi creditada em mais de 25% (US$ 4,6 milhões) da multa criminal devida aos Estados Unidos por conta do acordo relacionado com o SFO, e de mais de 33% (US$ 6,125 milhões) pelo pagamento feito às autoridades brasileiras. A SEC (reguladora do mercado de capitais americano), que estipulou uma penalidade de US$ 22,8 milhões a título de devolução dos lucros obtidos com os atos ilícitos, creditou cerca de US$ 22 milhões à empresa, também por conta dos acordos fechados com autoridades britânicas e brasileiras.
Aqui no Brasil, a CGU também anunciou no dia 25 de junho o fechamento do acordo com o John Woods, a AFWEL e sua subsidiária latino-americana. O acordo local envolve AGU e o MPF e se referem aos mesmos fatos relacionados na acusação do DoJ. No total, a John Woods vai pagar R$ 86,2 milhões (US$ 17.5 milhões) no Brasil, em até 30 dias após a assinatura do acordo. Do montante, R$ 67,3 milhões serão destinados para ressarcimento da Petrobras; R$ 13,5 milhões correspondem à multa prevista na Lei de Improbidade Administrativa, e outros R$ 5,5 milhões são relativos à multa prevista na Lei Anticorrupção, ambas revertidas à União. Assim como nos outros acordos, a John Woods se comprometeu a atualizar e aperfeiçoar suas políticas de governança e Compliance, incluindo os mecanismos de controle.
Segundo a CGU, a atuação coordenada da pasta, da AGU e do MPF com as autoridades estrangeiras representa a consolidação do papel das instituições brasileiras em casos envolvendo múltiplas jurisdições e reforça o compromisso com o combate à corrupção.
Recomendações para os hermanos
Em documento publicado no último mês de junho, a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), apresentou suas considerações sobre o avanço da Argentina em relação as suas políticas de integridade para o setor público.
Um dos problemas apontados é a fragmentação e as contradições impostas pelas três normas que regulam a integridade no setor público: a Lei de Ética Pública, o Marco Nacional de Emprego Público e o Código de Ética. Para a OCDE, a Argentina poderia reformar a Lei de Ética Pública para superar a fragmentação do arcabouço jurídico sobre ética.
A não aplicação do regime nacional de emprego público a todos os funcionários públicos é outro ponto de atenção por comprometer o princípio da equidade. Segunda a OCDE, a Procuración del Tesoro de la Nación e a Promotoria de Investigações Administrativas emitiram sentenças para expandir a aplicabilidade a todos os funcionários, a instituição acredita que a formalização dessas medidas seria crucial para garantir a segurança jurídica. Mais relevante, a eficácia do regime disciplinar é prejudicada pela limitada troca de informações entre os principais atores do sistema e os poucos indicadores de desempenho para avaliar sua eficácia.
Além disso, para os observadores da entidade, embora a Oficina Anticorrupção do país tenha tomado medidas para aumentar a conscientização sobre conflitos de interesse entre os funcionários públicos, como um simulador de conflito de interesses online, as orientações práticas com exemplos são raras. A OCDE acredita que a Argentina poderia fortalecer seu sistema de gestão de conflitos de interesse, dando a Oficina Anticorrupção poder para emitir recomendações vinculantes e obrigando funcionários de alto nível a consultar a agência sobre potenciais conflitos de interesse e a seguir recomendações específicas.
A OCDE também acredita que a autonomia do Auditor Geral de la Nación deve ser reforçada por meio de uma lei orgânica que estabeleça o seu mandato e independência para a execução das suas decisões, especialmente quando a aplicação de sanções fizer parte do seu mandato.
Por fim, a OCDE estimula a Oficina Anticorrupção a continuar encorajando as províncias e municípios a desenvolverem os seus próprios quadros de integridade e facilitar o intercâmbio de boas práticas e soluções para problemas comuns. Assim como a Sindicatura General de la Nación (SIGEN, equivalente a Controladoria Geral da União) e os diferentes ministérios e entidades governamentais devem intensificar seus esforços para desenvolver a apropriação do controle interno. Os ministérios e entidades setoriais devem assumir a responsabilidade de produzir os seus mapas de risco, sendo eventualmente orientados pela Oficina Anticorrupção e pelo SIGEN.
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Artigo publicado originalmente na edição 32 da Revista LEC.
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