Temos ressaltado que o tema da ética e da integridade nas organizações (e na vida) precisa ser realmente estratégico e permear todas as escolhas, todas as decisões, todas as práticas e operações, para que seja genuíno, real, e percebido “no dia a dia” e na cultura.
Sob pena de não ser de fato um valor e um propósito, e de até mesmo “permitir esgwashing”, as organizações precisam garantir que suas operações são responsáveis, coerentes e consistentes no que tange a esses temas, pois o mero “discurso”, e a orientação “rasa/superficial” gera danos e prejuízos a todos.
Muito mais do que um projeto ou até de um programa, precisa ser uma decisão da organização como um todo e hoje destacamos uma das questões mais sensíveis e delicadas nas empresas, por abordar a própria atuação da área de compras/suprimentos.
Os profissionais que atuam nessa função, o próprio “job description” e a razão de existir da área tem sido, tradicionalmente, treinados e orientados para reduzir custos.
Em alguns casos, existe uma tentativa real das organizações de despersonalizar escolhas de fornecedores, na tentativa de se reduzir favorecimentos e “perseguições”, pontos importantes para a Governança Corporativa e o Compliance, mas a “bandeira geral “é a redução de custos.
Existem ao menos dois grandes desafios nessa orientação e nessa prática, que (nos dois casos) derivam da obsessão pelo “preço baixo”.
De um lado a busca pelo preço puramente mais baixo pode se tornar uma armadilha, ao ignorar outros componentes do produto/serviço adquirido, pois “via de regra” não existem “mágicas” para a composição de preços “milagrosamente baixos”.
Preços muito baixos (abaixo do mercado e da maioria dos concorrentes do fornecedor) tendem a “sacrificar” melhores práticas sociais, ambientais, éticas e de qualidade; que nem sempre são sequer conferidas/avaliadas pelas áreas de compras e suprimentos. O “barato que sai caro” costuma penalizar a empresa que “foca” apenas no preço (nominal) mais baixo e escolhe ignorar as demais questões formadoras dos custos dos fornecedores responsáveis e conscientes.
Além disso, muitos “compradores” costumam apertar tanto os fornecedores que terminam por “espremer” tais pessoas e empresas que se “desesperam” com a ameaça da perda de vendas e de clientes, sacrificando muito mais do que o razoável (e sustentável).
Um dos ”recados” que parte do mercado está “passando” às suas equipes é tão simples quanto fundamental, “não faça com os parceiros o que você não gostaria de fizessem com você”, pois a construção de parcerias engloba relacionamento, tempo, valores e princípios, respeito (pelo trabalho e pelo produto do fornecedor), e cuidado.
A alta administração, os investidores, e as áreas de governança corporativa, compliance e sustentabilidade precisam rever os pressupostos, a orientação e o treinamento da área de compras, que não deveria ser subordinada apenas aos temas financeiros.
As empresas precisam mesmo controlar seus custos e para tanto escolher as melhores alternativas de suprimentos do mercado, de forma permanente, mas nem sempre são tomamos os devidos cuidados, e passadas as diretrizes corretas às equipes que cuidam dessa questão,
Defendemos que as áreas de compras/suprimentos devam passar a ser orientadas e treinadas para ajudar as empresas a realizarem as “melhores compras” (e não apenas a visão equivocada do preço “puro’).
“Apertar” demais os seus fornecedores (que muitos chamam erroneamente de parceiros, mas que no fundo são “apertados” permanentemente) não apenas não passa pelos crivos de bons programas de governança corporativa e de ‘compliance’, como ainda demonstra a falta de compromisso efetivo com as melhores práticas, com a ética e com a integridade.
Um dos caminhos para melhorar as compras e os sistemas e fluxos que as compõem é visitar (física e presencialmente) e conhecer os fornecedores, para conhecer suas operações e práticas, entendendo e “checando” os métodos de trabalho para que fique evidente a composição de seus custos e preços.
Parte do “problema/desafio” é o estabelecimento de “orçamentos/budgets’ irreais e inviáveis que costumam levar as áreas de compras a procurar fornecedores com demanda sabidamente inviáveis, forçando seus “parceiros” a desistir das vendas ou a caírem nas armadilhas de sacrificar matérias primas, suprimentos, treinamentos, remunerações, condições de trabalho etc.
Em muitos casos chega-se à perigosa (e geralmente equivocada) prática do “leilão reverso” insustentável, cujos parâmetros levam a “vencedores” desesperados, que se humilham a trabalhar/vender por preços e condições insustentáveis, que por vezes ‘precisam contar” com práticas desleais, desumanas e com sacrifício de qualidade.
A questão em tela precisa abraçar ainda a própria remuneração e as metas dessas áreas, para que incentivos e premiações passem a abordar justamente as “melhores compras”, conceito em que o custo/preço certamente está inserido, mas que está longe de ser o único ou o principal – atuando, como “termômetro” da composição desse conceito as áreas que aqui conclamamos a avaliar com mais cuidado e atenção esse tema.
Tem sido frequente a ocupação das diferentes mídias e da imprensa os “incidentes” (e até “escândalos”) relacionados a produtos, serviços e práticas das organizações, que em muitos casos se apressam em tentar “culpar” fornecedores, prestadores de serviço e “terceirizados”, esquecendo-se não apenas que a sua imagem e a sua reputação não se desconectam da cadeia produtiva e de valor, assim como das culpas “in elegendo” e “in vigilando”.
Ainda que “cada caso seja um caso” (e que tenhamos mesmo que individualizar episódios e condutas), é comum que incidentes/escândalos, uma vez investigados, demonstrem falhas de governança, de “compliance”, de procedimentos, de práticas, de treinamento, e de escolha de fornecedores/parceiros.
Fornecedores e prestadores de serviços são ESCOLHIDOS pelas empresas, e devem ser por elas orientados e (e em alguns casos e questões) treinados para que integrem o conceito integrado de boas práticas e os padrões de conduta adequados. A responsabilidade, tanto jurídica quanto social, passando justamente pela governança corporativa, pelo “compliance” e pela sustentabilidade/E-ESG é de toda a “cadeia de valor/suprimentos”.
Treinamentos, orientações e metas pautados pelo antigo conceito do “preço baixo” precisam ser revistos e atualizados, para que passem a contemplar o que reiteramos ser o conceito da “melhor compra”.
Compras/suprimentos precisam ser reorientados, e contar com o apoio de sistemas/softwares e com a Inteligência Artificial com muita responsabilidade e muito cuidado. A pressa e a aparente simplificação e automação desses processos dificilmente deixará de reduzir os cuidados e os devidos “filtros” nos fornecedores, que precisam ser realmente selecionados, visitados, conhecidos e entendidos, para que os critérios de escolha de compras sejam melhorados.
Revisitemos esse tema em nossas organizações, verifiquemos os fundamentos de cada área e prática envolvidos nesses processos de seleção, com vistas a termos nas nossas empresas, os melhores produtos e os melhores serviços, construídos de forma conjunta com os melhores parceiros e fornecedores, demonstrando o efetivo compromisso com o “melhor”.
É um dos pilares para que a sua organização consiga ser efetivamente ética, integra, responsável, consciente e sustentável (de verdade!!).
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