Um dos problemas com as quais as Unidades de Inteligência Financeira costumam lidar sempre que estabelecem uma nova normativa ou inserem novos setores como pessoas obrigadas (e esses setores encaram a medida com a devida seriedade) é o de lidar com um grande número de comunicações feitas pelas empresas na entrada em vigor da nova regra. Na dúvida sobre se uma situação deve ou não ser comunicada, comunique-se. Em geral, passado algum tempo, o COAF vai deixando claro aquele setor o que eles esperam receber como comunicação e o que não é necessário ser comunicado. Mas a comunicação excessiva pode funcionar também como uma forma de tentar dar uma enganada no regulador.
Num caso relatado pelo conselheiro Gustavo Henrique de Vasconcellos Cavalcanti no último dia 15 de fevereiro, o plenário do COAF aplicou multas de R$ 10 milhões à C.H.M do Brasil Metais, de outros R$ 5 milhões ao seu controlador e administrador Giacomo Dogi, e de mais R$ 1 milhão a Heitor de Araújo Franco, também administrador da empresa que negocia e exporta ouro e outros metais para empresas de beneficiamento, como indústrias e joalherias (e não o ouro como ativo financeiro, o que só pode ser feito via DTVM’s). O motivo para essas sanções? O descumprimento do dever de manutenção do registro de transações, também, por comunicação indevida de operações por uso de valores em espécie que o próprio comunicante veio a afirmar não terem ocorrido.
“Justificar o envio de 3.101 comunicações espúrias por mais de quatro anos como ‘equívoco’ e ‘excesso de cautela’ é absolutamente descabido”, disse o relator em seu voto. “Comunicações infundadas não se confundem com erro evitável, muito menos com excesso de cautela. […] A conduta contumaz de enviar comunicações espúrias, aliás, sequer torna possível estimar com um mínimo de precisão quantas dessas deram ensejo a difusões de relatórios de inteligência financeira, abertura de investigações e outras movimentações do aparato repressivo do Estado”, reforça Cavalcanti em seu voto.
E as sanções não pararam por aí. A C.H.M. também foi multada em outros R$ 10 milhões pela não comunicação de operações que, segundo o que já está disposto pelo regulador, poderiam constituir-se em sérios indícios de crimes de lavagem de dinheiro ou de ações relacionadas a esse crime. Por essa mesma situação, Dogi e Araújo Franco também foram multados em mais R$ 5 milhões e R$ 1 milhão, respectivamente. Pela deficiência na adoção de políticas, procedimentos e controles internos, compatíveis com o porte e o volume de operações, a empresa foi multada em R$ 120 mil, Dogi em R$ 60 mil, e Araújo Franco em outros R$ 15 mil. Além disso, a empresa e os administradores foram advertidos pelo COAF pela irregularidade no dever de identificação e manutenção de cadastro atualizado de seus clientes. A empresa também foi instada a proceder com a retificação de todas as comunicações erroneamente comunicadas, via SisCoaf.
No total, as sanções pecuniárias do caso somam R$ 32,195 milhões, o que faz dele um marco na história da UIF brasileira, que ao longo da sua história não chegou ainda ao marco de R$ 200 milhões em multas aplicadas.
Mas a pena mais extrema ficou guardada para os administradores, que foram inabilitados para o exercício do cargo de administrador de empresas do setor financeiro ou de segmentos que estejam sob a égide do COAF. Dogi não poderá exercer tais funções por cinco anos. Seu colega, Araújo Franco, por um ano. Todas as sanções aplicadas foram aprovadas por unanimidade pela plenária do COAF. “Entendo que a continuidade das atividades da CHM do Brasil, oxalá doravante livres das irregularidades aqui constatadas, deve expurgar o elemento socialmente reprovável que lhe deu causa. E os elementos dos autos levam à inescapável conclusão de que os administradores da CHM do Brasil não apresentam condições de operar em um mercado sujeito a regras mais rígidas de PLD/FT”, concluiu o relator em seu voto.