Quem trabalha com compliance deve conhecer a realidade das chamadas “EUquipes”. Diante de orçamentos apertados e de uma certa desconfiança da capacidade estratégica da área, a maioria das empresas não dispõe de recursos para a composição de times numerosos. Cabe à liderança do departamento lidar com essas limitações para tirar o melhor proveito do que se tem em mãos. É neste ponto que entram dois fatores imprescindíveis para uma boa gestão do compliance: visão estratégica e o entendimento de como a tecnologia se encaixa em cada contexto – sim, porque ele pode variar de empresa para empresa.
Visão estratégica como ponto de partida
Defendo que a visão estratégica deva ser o ponto de partida para qualquer decisão no departamento de compliance. Por exemplo, se a equipe é enxuta, o primeiro passo é pensar no papel de cada pessoa de acordo com as funções a serem desempenhadas. E, antes de advogar em favor das maravilhas do uso da tecnologia, faço uma ressalva fundamental: pelo menos até agora, não há potencial tecnológico capaz de substituir a criatividade e o olhar crítico capazes de nortear a tomada de decisões estratégicas. Portanto, antes de mais nada, valorize o seu capital humano ao avaliar a composição adequada do time.
Como a tecnologia contribui para as atividades do departamento
Entendo que o uso de soluções tecnológicas é muito bem-vindo para aliviar parte significativa das tarefas burocráticas e massivas do departamento. Por exemplo, não faz sentido alocar pessoas para a ingrata tarefa de rodar due diligence manualmente, pesquisando CPFs e CNPJs de grupos de interesse “na unha”. Além de contraproducente, esse modus operandi é muito mais propenso a erros. No lugar do compliance analógico, há um mundo de possibilidades apoiadas por soluções de análise de dados e de inteligência artificial, no qual informações relevantes para as diligências são disponibilizadas em tempo real e de forma precisa.
Temos cases interessantes da aplicação de tecnologias no compliance da Neoway. Sendo uma empresa que oferece soluções de Big Data Analytics e Inteligência Artificial, fez todo o sentido para nós incorporá-las no dia a dia do departamento em busca de resultados mais eficientes. E deu certo! Conseguimos automatizar com sucesso tanto a gestão de terceiros quanto a análise de conflitos de interesse, o que permitiu criar um fluxo de aprovação automática para grande parte das nossas demandas, com base em níveis de risco pré-definidos. Assim, apenas os casos de maior complexidade passaram a ser submetidos ao crivo humano da mesa de compliance.
Resultados da implementação de processos automatizados
No ano de 2020, época em que implementamos esse processo automatizado, os resultados foram bastante expressivos. Quando passamos a utilizar a plataforma de due diligence para gestão de terceiros, foram economizados R$ 452,5 mil e poupados 1.267 dias no SLA que seria necessário com o uso de consultorias externas. Já nas análises de conflitos de interesses, o envio de formulário para todos os funcionários da Neoway, acompanhado de parametrização tecnológica, gerou uma economia de 45 horas de leitura de documentos que não apresentavam riscos declarados. Ou seja, “ganhamos” uma semana inteira de trabalho da equipe que pôde ser revertida para análises dos formulários que continham riscos declarados e mereciam especial atenção.
E as vantagens do uso da tecnologia não param por aí. Na parte de treinamentos, as soluções digitais contribuem para o aumento do alcance das atividades, assim como impactam positivamente a adesão às políticas por meio de relatórios que otimizam o tempo da alta liderança. Combinadas, essas ações amplificam as mensagens do compliance e ajudam a torná-lo parte da cultura de empresas de todos os tipos e tamanhos. Chamo atenção para esse ponto porque engana-se quem pensa que um compliance digital é privilégio de programas maduros ou com orçamentos robustos.
Adoção de tecnologias em negócios
A adoção de tecnologias pode – e deve – ser personalizada para cada contexto e modelo de negócios, e a melhor forma de endereçar esta questão é pensar sob a ótica de gestão dos riscos. Em outras palavras, a estratégia deve ser desenvolvida em linha com os riscos de maior complexidade e os eventos mais críticos. Tendo esse cenário claramente desenhado, é hora de usar a inteligência dos dados e os indicadores automatizados para tomar decisões com mais consciência e precisão.
A tecnologia, por si só, não faz milagres. É preciso saber onde, por que e como aplicá-la para uma estratégia eficiente e eficaz no compliance. E para esse propósito, a equipe será mais que essencial, mesmo que enxuta.
Imagem: unDrawn