Num processo de evolução natural, as empresas serão mais cobradas do que nunca para mostrar a efetividade dos seus programas de compliance
Talvez o tema não faça mais tanto barulho na grande mídia e junto à população em geral como dois ou três anos atrás, no auge das prisões de alguns dos maiores empresários do país – algo inédito e extremamente impactante para o país e para o ambiente de negócios brasileiro. Mas não se engane, a necessidade de manter a área de compliance para monitorar o dia a dia das operações da empresa e, quando necessário, responder rapidamente aos problemas nunca foi tão importante. Por isso, vale a pergunta: a sua empresa alocou os recursos necessários para dar suporte ao trabalho dos compliance officers em 2018?
Se a empresa quer estar segura e protegida, é muito importante que a resposta tenha sido sim. E, mais do que isso, que os recursos alocados sejam, de fato, os necessários para todas as necessidades.
Ainda que a Lava Jato esteja em outro momento, numa espécie de guerra contra os políticos, as operações de combate à corrupção – em todos os níveis e de todos os portes – continuam a todo o vapor, impactando a relação do setor privado com o setor público e também entre companhias privadas. Com isso, a demanda de trabalho da área só tende a aumentar daqui para frente. E essa demanda deverá ser sentido no dia a dia das empresas de forma muito mais concreta.
No campo regulatório, a recente publicação da Lei 7753/2017 do estado do Rio de Janeiro é o prenúncio da importância que o poder público está atribuindo ao compliance como forma de mitigar eventuais riscos de corrupção em compras e licitações públicas. A legislação, que já está em vigor, obriga fornecedores de bens com contratos superiores a R$ 1,5 milhão e de prestadores de serviços com negócios que ultrapassem os R$ 600 mil a manterem um programa efetivo de compliance em suas empresas. Os fornecedores que não dispuserem de um programa no momento da contratação terão um prazo para implementar o programa. Caso não o façam, estarão sujeitas a multas.
Alguns outros entes da Federação já dispunham de cláusulas de compliance em alguns de seus contratos. Mas, ao estabelecer uma legislação específica, o Rio – talvez o estado no qual os efeitos da corrupção venham se mostrando mais nefastos – leva o tema para um novo patamar ao abarcar todos os seus fornecedores relevantes. Muitos outros estados e cidades também se movimentam no sentido de terem as suas próprias legislações sobre o tema.
Num primeiro momento, esses processos estarão muito mais focados em tramites formais, ou seja, no envio da documentação referente à área de compliance e a assinatura de termos, tal qual já acontece com outras demandas dos estados. Nesse sentido, muitas empresas que ainda não contam com programas de compliance terão de correr atrás. Isso deve levar muitas companhias, num primeiro momento, a investirem num compliance “by the book”, um programa que conta com os elementos básicos e formais, principalmente o código de conduta, um PPT de treinamento, alguma mensagem do dono ou do diretor da empresa reforçando que aquela é uma empresa ética e, até, algum e-mail para servir de endereço do canal de denúncia. Ok, todo mundo precisa começar de algum ponto. Mas quem parar por aí (e isso vale para muitas empresas que já fizeram esse processo há dois ou três anos, no auge da fase empresarial da Lava Jato) corre tantos riscos quanto quem não fizer nada.
Os diferentes órgãos de controle do poder público (em todas as três esferas) sabem que o fato de a empresa assinar num contrato que tem um programa de compliance não é garantia de que o mesmo programa seja efetivo. E, ao contrário do que muitos podem achar, existem movimentações intensas nesses órgãos (e entre eles) para aperfeiçoar mecanismos de auditoria já existentes e aplicá-los à avaliação dos programas de compliance dos seus fornecedores. Entre os mecanismos de controle, além da utilização da própria infraestrutura de auditoria — que já existe hoje e é utilizada para o acompanhamento de grandes obras, por exemplo–, existem outras possibilidades em estudo, como a validação de empresas independentes pelo poder público que vão certificar esses programas.
Na iniciativa privada, a toada é a mesma. As maiores companhias já estão exigindo de seus fornecedores programas de compliance. E quanto mais desenvolvido o programa dessa empresa maior a exigência sobre a qualidade e, principalmente, a efetividade do compliance praticado por seus parceiros de negócios. Em escala ainda embrionária, mas com perspectivas de avançar, ter um bom programa de compliance vai determinar a taxa de juros que o banco vai cobrar de uma empresa. Isso já tem sido aplicado em alguns contratos e a tendência é que a qualidade do programa de compliance da empresa seja levado em conta na hora de avaliar os riscos do cliente e, assim, ajudar a compor a taxa do empréstimo.
Inegavelmente, trata-se de um cenário virtuoso para o ambiente de negócios no Brasil. E de um grande desafio para os profissionais de compliance e as empresas nas quais atuam. Compliance, como qualquer área de apoio ao negócio, demanda recursos. É preciso desde já endereçá-los no orçamento de 2018 para que o profissional responsável pela área possa desempenhar o seu papel a contento, o que inclui viagens para explicar o programa e ministrar treinamentos presenciais para todos os funcionários, sistemas de educação à distância no caso de empresas maiores, canal de denúncias independente (item que já é exigido para fornecedores de órgãos públicos e autarquias federais) e sistemas de monitoramento online. Como o departamento de compliance, na imensa maioria dos casos, conta com apenas uma pessoa (com um assistente, quando muito), é fundamental alocar no orçamento a verba para a contratação de serviços especializados como escritórios de advocacia, auditorias especializadas, empresas de treinamento e educação entre outros serviços, que, na prática, funcionam como a única maneira que um profissional de compliance tem para dar conta dessa tarefa monumental. E, claro, não se pode esquecer de que o mundo do compliance é tão dinâmico quanto o de qualquer outra área de negócios. Por isso, alocar recursos para o treinamento e o aperfeiçoamento do próprio compliance officer é essencial para que ele possa conduzir à empresa num caminho de ética e transparência, alinhada às necessidades do negócio.