A fiscalização dos Programas de Integridade em contratos e processos licitatórios envolvendo a Administração Pública tem ganhado crescente relevância, demandando atenção especial de licitantes e contratados.
Essa tendência foi reforçada pelo Decreto nº 12.304/2024, de 9 de dezembro de 2024 [1], que regulamentou dispositivos da Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) sobre a exigência de programas de integridade em três situações específicas. São elas: (i) contratações de grande vulto; (ii) como critério de desempate de propostas de licitantes; e (iii) para a reabilitação de licitantes ou contratados.
A partir do momento em que os critérios de avaliação desses programas são estabelecidos, cria-se um ambiente favorável à instauração de processos de responsabilização de empresas que não atenderem aos referidos parâmetros, com a possível aplicação de sanções.
Ainda, o Decreto atribuiu à Controladoria-Geral da União (CGU) a competência para supervisionar os programas de integridade no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, sendo responsável tanto pela avaliação quanto pela condução de processos de responsabilização em casos de infrações.
Diante disso, surge a necessidade de entender: quais diretrizes devem ser observadas para a implementação e manutenção dos programas de integridade? Quais instrumentos estão disponíveis para avaliar a maturidade desses programas conforme as exigências da Lei de Licitações?
Diretrizes do Programa de Integridade
O Decreto nº 12.304/2024 estabelece diretrizes essenciais para a avaliação de programas de integridade, considerando os pilares fundamentais de conformidade, além do porte e das especificidades de cada empresa. Determina, ainda, que o programa deve atender a critérios mínimos para ser considerado implantado, desenvolvido ou aperfeiçoado.
Não obstante, caberá ainda ao Ministro da CGU regulamentar:
- A metodologia de avaliação e os critérios mínimos para considerar o programa de integridade como implantado, desenvolvido ou aperfeiçoado;
- O modelo de declaração previsto na Lei de Licitações, que deverá ser apresentado pelo licitante para fins de desempate entre duas ou mais propostas; e
- As informações e documentos necessários para comprovar a implantação, desenvolvimento ou aperfeiçoamento do programa de integridade.
A despeito de a regulamentação complementar permanecer pendente, é fundamental que as empresas iniciem, desde já, a revisão de seus programas de integridade ou, se inexistentes, a sua implementação, consoante as diretrizes estabelecidas no Decreto.
Incentivos e Alternativas
O Decreto estabelece que a CGU poderá dispensar a obrigatoriedade de submissão de documentação e avaliação do programa de integridade se a empresa já tiver sido aprovada (com reconhecimento ainda vigente) em programas específicos de fomento à ética e à integridade promovidos pela CGU. Nesse sentido, destacam-se duas iniciativas relevantes:
- (i) Pró-Ética: Iniciativa de reconhecimento promovido pela CGU, que avalia e premia os programas de integridade das empresas aprovadas, divulgando seus nomes no site da CGU como exemplos de integridade corporativa;
- (ii) Pacto Brasil pela Integridade Empresarial: Iniciativa que permite às empresas assumirem voluntariamente um compromisso público com a integridade, por meio de uma autoavaliação baseada em critérios definidos pela CGU. Embora não resulte em uma certificação ou premiação formal, essa autoavaliação pode ser o ponto de partida para o aprimoramento dos programas de integridade.
Ao divulgar ao Decreto, a CGU destacou que “as empresas poderão aderir ao Pacto Brasil pela Integridade Empresarial, uma iniciativa do governo federal que oferece uma plataforma gratuita de autoavaliação para ajudar o setor privado a implementar programas de integridade eficazes” [2]. Verifica-se, portanto, que o Pacto Brasil é um instrumento apto a ser utilizado para a avaliação da maturidade do programa de integridade das empresas.
Em ambos os casos (Pró-Ética ou Pacto Brasil), é essencial que as empresas contem com apoio especializado, de forma que as evidências produzidas como resultado dessas avaliações sejam compatíveis com as exigências dos programas de integridade, reduzindo riscos de sanções em eventuais fiscalizações.
Sanções pelo Descumprimento
O descumprimento das obrigações previstas no Decreto pode acarretar penalidades severas, como:
- Advertência;
- Multa de 1% a 5% do valor da licitação ou contrato;
- Impedimento de licitar e contratar com a Administração Pública; e
- Declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.
Em acréscimo ao exposto, ressalta-se que em caso de prática de atos lesivos previstos na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), as sanções dispostas na referida legislação também poderão ser aplicadas. Cabe destacar, ainda, que a prestação de declarações falsas sobre a implementação de programas de integridade poderá acarretar na responsabilização não apenas na esfera administrativa, mas também na esfera penal.
Conclusão
Diante desse cenário, é fundamental que as empresas realizem uma avaliação detalhada da maturidade de seus programas de integridade e implementem as medidas necessárias para atender às exigências legais de maneira célere e eficaz, notadamente para aquelas empresas que participem de processos licitatórios.
A adoção de programas de fomento à ética e integridade promovidos pela CGU – tais como o Pró-Ética ou o Pacto Brasil pela Integridade Empresarial – configura não só uma vantagem competitiva no mercado, mas também uma estratégia eficaz de mitigar riscos e demonstrar compromisso com a integridade, demonstração essa que deverá se dar a partir de evidências compatíveis com os normativos aplicáveis.
Ademais, não se pode olvidar que a CGU tem competência para fiscalizar os administrados de ofício, bem como em virtude de denúncias realizadas por terceiros, com relação à maturidade dos seus programas de integridade e veracidade de informações prestadas ao longo dos processos licitatórios e contratações públicas. No contexto das licitações e contratos públicos, é comum que licitantes e concorrentes utilizem todos os instrumentos legais disponíveis para contestar resultados e buscar vantagens competitivas.
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[1] O Decreto entrará em vigor sessenta dias após a sua publicação (que se deu em 10.12.2024).
[2] Dia internacional de combate à corrupção: Presidente Lula assina decreto que fortalece integridade em contratos públicos.
Artigo por Graziella Dell’osa e Emily Nobre, Sócia Diretora e Advogada Associada do GCAA.
Imagem: Envato