Recentemente tivemos a promulgação de duas importantes legislações que tratam sobre o Combate ao Assédio Sexual, a primeira, Lei n° 14.457/2022, aplicável no âmbito privado, e a segunda, Lei n° 14.540/2023, aplicável no âmbito da Administração Pública.
A Lei n° 14.457/2022 acrescentou às atribuições das CIPAs a tarefa de promover ações de prevenção ao assédio e, por força desta lei, estas comissões, inclusive, agora são chamadas “Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio”. Por sua vez, a Lei n° 14.540/2023 institui o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual, que tem como objetivo prevenir e enfrentar o assédio e práticas semelhantes no âmbito da Administração Pública, bem como capacitar os agentes públicos para a prevenção e solução de casos.
Ainda, o tema foi objeto de um Guia publicado pela Controladoria Geral da União, que confere a devida relevância ao debate do tema, esclarecendo que:
“Garantir relações profissionais saudáveis e ambientes de trabalho respeitosos e éticos é fundamental para a saúde física e mental de trabalhadoras e trabalhadores. O trabalho representa uma das dimensões que define a qualidade de vida e a inserção social das pessoas. No entanto, o assédio é um problema coletivo que impacta a convivência entre colegas de trabalho, viola a dignidade e a integridade das pessoas, bem como a salubridade e a produtividade no ambiente de trabalho.” (2023, CGU, GUIA LILÁS: Orientações para prevenção e tratamento ao assédio moral e sexual e à discriminação no Governo Federal)
Com isso, percebemos que o Combate ao Assédio, que já era um compromisso e objeto de ações práticas em muitas empresas e instituições como decorrência da implantação e aperfeiçoamento de Sistemas de Integridade, passa agora a ser também uma obrigatoriedade legal.
Em razão disso, é reafirmada a importância dos Sistemas de Integridade, que trarão as ferramentas necessárias para efetivar as diretrizes demandadas nas legislações, dentre as quais citamos: a disseminação de campanhas educativas, incentivo a boas práticas no ambiente de trabalho, divulgação de canais para reporte, divulgação da legislação e políticas públicas (previstas na Lei n° 14.540/2023); e inclusão de regras de conduta, fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias, inclusão do tema nas atividades da Cipa e realização de ações de capacitação (previstas na Lei n° 14.457/2022).
Entretanto, um ponto essencial passa desapercebido em ambos os diplomas legais: o diagnóstico, que invariavelmente requer o estabelecimento do “contexto da organização”, conforme referência a ISO 37.301. E não há uma efetiva prevenção sem o entendimento do cenário organizacional.
Isso porque as situações de assédio (moral e sexual) ocorrem no bojo de um ambiente de trabalho, ou seja, estão inseridas em um cenário específico. Nesse sentido, podemos dizer que o assédio é uma patologia de um ambiente de trabalho disfuncional, seja devido a determinada cultura corporativa, estrutura organizacional ou até falta de controles abrangentes ou pontuais.
Em outras palavras, o assédio compreende a expressão da organização como um todo, e é diretamente impactado por ela, não se limitando aos relacionamentos interpessoais dos colaboradores.
Além disso, se consideramos que o objetivo das ações de combate ao assédio não é apenas contingenciar esse tipo de situação, mas, sim, combater, prevenir, evitar a sua ocorrência, deve ser realizado um profundo trabalho com a finalidade de compreender as possíveis causas e origens dos diversos tipos de assédio moral (vertical descendente, organizacional, vertical ascendente e horizontal) ou assédio sexual, para que, posteriormente, as etapas de treinamento e comunicação estejam endereçadas a estas.
Esta etapa de diagnóstico, que contempla a aplicação de pesquisas, realização de entrevistas e a consolidação da Matriz de Riscos, será, portanto, essencial para a assertividade das ações práticas que serão desenvolvidas no âmbito de combate ao assédio e para a obtenção de resultados concretos nas organizações, no mesmo racional de efetividade de Sistemas de Integridade maduros.
É apenas a partir do mapeamento e diagnóstico do cenário organizacional que poderemos implantar ferramentas de gestão aderentes à real necessidade da instituição e aplicar processos de aculturamento e capacitação capazes de promover a construção de um ambiente de trabalho mais ético e seguro.