Por Luciana Silveira*
A adoção de soluções tecnológicas na área de Compliance cresce à medida que as empresas percebem as vantagens significativas no seu desempenho, tanto em eficiência quanto eficácia. Diante da realidade de equipes enxutas, da multiplicidade e complexidade dos dados a serem consultados, e da necessidade de maior agilidade na tomada de decisões, a tecnologia é um caminho sem volta.
Esse foi o tema do webinar conduzido na semana passada pelo escritório de advocacia Demarest, um dos mais respeitados do País. Tive a oportunidade de participar do evento ao lado de profissionais de renome, como Alexandre Senas e Juliana Oliveira, sob mediação do experiente Eloy Rizzo Neto. No evento, compartilhamos experiências e lições aprendidas sobre o impacto da tecnologia para a mitigação de riscos de compliance, e pude contar os resultados do uso desses recursos na implementação do NeoEthics, o programa de Compliance da Neoway.
O evento se propôs a discutir pontos essenciais da contribuição da tecnologia no departamento e colocou em perspectiva três grandes frentes: as ferramentas que estão disponíveis para melhorar a gestão do risco de compliance; o uso de soluções para investigação interna; e o papel dos gestores e gestoras da área em um cenário com tanta tecnologia.
Sou fã de carteirinha do uso de soluções tecnológicas para o Compliance e não escondo. Realmente acredito que as ferramentas, quando aplicadas com objetivos claros e alinhados à realidade do negócio, têm um enorme potencial de alavancar a eficiência e a eficácia dos programas de compliance.
MELHORIA NA GESTÃO DO RISCO DE COMPLIANCE
A tecnologia aplicada à análise de dados, por exemplo, permite otimizar tarefas burocráticas e ganhar agilidade na prevenção, detecção e remediação de riscos. Consequentemente, sobra mais tempo para utilizar o capital humano em demandas estratégicas e criativas.
Claro que pra mim, trabalhando numa empresa que desenvolve soluções de Big Data Analytics e Inteligência Artificial aplicadas para a gestão do risco de compliance, entre outros pilares de negócios, fazer uso da tecnologia é muito mais fácil. A Neoway respira tecnologia e inovação. Mesmo assim, para sair do campo das ideias, achei válido compartilhar no evento como apliquei essas soluções no dia-a-dia para Due Diligence de Terceiros, Conflito de Interesses e Cortesias Corporativas.
No caso das due diligences de Terceiros, o desafio era aprovar o maior número de Terceiros, no menor tempo possível, e com segurança. Para isso, usei a solução de Risk & Compliance da Neoway e cadastrei uma busca avançada. Com essa busca, a identificação de eventuais pontos de alerta nas análises ficou mais simples e rápida (por ex, a presença de PEPs no quadro societário; a inclusão de sócios da empresa na lista de trabalho escravo; ou uma eventual mídia negativa envolvendo a organização).
Quando as áreas de compras ou de vendas indiretas rodam o checklist parametrizado para avaliar Terceiros, os resultados são disponibilizados automaticamente na plataforma. Com as informações em mãos, os colaboradores da Neoway fazem o cadastro da consulta, bem como os resultados encontrados na due diligence, no sistema de gestão de demandas.
Caso não haja pontos de atenção, a due diligence é automaticamente aprovada. Depois disso, ainda vem a melhor parte: cadastro todos os Terceiros recorrentes na solução da Neoway chamada Watcher e a ferramenta faz um monitoramento contínuo dos pontos de atenção da busca avançada. Havendo mudanças no cenário avaliado, a própria ferramenta envia email para a equipe de Compliance.
O uso das ferramentas da Neoway me permitiram atingir resultados expressivos:
- 100% dos Terceiros avaliados (Fornecedores, Parceiros de Negócios e Entidades Beneficiadas).
- 60% com aprovação automática, sem a necessidade de análise de mesa da equipe de Compliance.
- 322 dias livres para se dedicar a outras atividades (SLA médio de 2 dias para análise de mesa).
Para todos os casos que mostrei no evento, o uso da tecnologia me permitiu tornar a gestão dos riscos de compliance na Neoway mais eficiente e eficaz.
A Juliana Rodrigues, Diretora Global de Compliance na Coty, também compartilhou sua visão de que a tecnologia deve ser utilizada para apoiar decisões de impacto na área, e não para fazer microgerenciamento do dia-a-dia. Como ela disse, na área de gestão de doações e patrocínios, por exemplo, o apoio tecnológico pode ser útil para identificar presentes de milhares de reais, analisar a lista dos 10 maiores contratantes, os tipos de contrato e se eles têm remuneração no êxito ou não.
Um dos principais ganhos citados pela Juliana a partir do uso da tecnologia é o amplo monitoramento contínuo de riscos que a Coty faz em diversos países, com características e culturas diferentes, algo que seria inviável manualmente. Ela contou que, na China, as vendas via e-commerce e redes sociais, incluindo novas plataformas como TikTok, trazem riscos diferentes de vendas normais e que precisam ser monitorados. Tudo isso transforma o uso da tecnologia em um caminho sem volta.
Nesse sentido, Alexandre Senas, sócio da área de Risco Regulatório da Deloitte, chamou atenção para a importância da adoção de soluções tecnológicas capazes de identificar, avaliar adequadamente os riscos e tornar as informações acessíveis a outras áreas também. Até porque, na percepção dele, profissionais de Compliance têm sido acionados a respeito de assuntos que não são prioritários dentro do programa, o que pode sobrecarregar a área. Um exemplo citado por ele são questionamentos relacionados à ESG (as boas práticas ambientais, sociais e de governança), que não estão diretamente relacionadas ao escopo do Departamento. Para dar vazão a eventuais demandas extras e ganhar eficiência nesse tipo de resposta, Senas compartilhou a adesão das empresas a assistentes virtuais, que são treinados via inteligência artificial e podem evoluir com o tempo. De forma automatizada e ágil, eles interagem com os colaboradores para tirar dúvidas e, assim, otimizar o desempenho da equipe de Compliance.
TECNOLOGIA PARA INVESTIGAÇÃO INTERNA
No tema investigação interna, vale o destaque para sistemas de controles automatizados que permitem obter uma visão clara, precisa e organizada dos relatos no canal de denúncias, um ponto levantado por todos os palestrantes. No caso da Juliana, inclusive com acesso em vários idiomas para facilitar a comunicação e o apoio significativo da área de RH para a condução de investigações que têm um componente de postura comportamental. Na Neoway, o canal de denúncias é externo e também contamos com o envolvimento de outras áreas, como a de segurança de informação, para ganhar capilaridade na atuação do Compliance. Entre os nossos indicadores, o mais interessante para compartilhar é o de que 80% dos relatos são identificados, o que mostra confiança em relação à cultura do Compliance e o trabalho desenvolvido pela equipe.
Nesse caso, o uso de tecnologia ajuda a condensar as informações mais relevantes e apresentá-las, de maneira intuitiva, para as mais variadas linhas de reporte. Como o Senas comentou, por meio de soluções digitais, dá para evitar a aplicação de medidas disciplinares diferentes para casos similares, garantindo isonomia no tratamento às investigações internas, algo muito valioso para qualquer Departamento de Compliance.
O PAPEL DOS GESTORES DE COMPLIANCE EM MEIO A TANTA TECNOLOGIA
Por fim, a pergunta que não quer calar, feita pelo Eloy: nós, profissionais de Compliance, vamos perder os nossos empregos? Na minha opinião, não. Nem agora e nem nos próximos anos. Vejo as soluções digitais como aliadas, e não como ameaças, afinal elas otimizam tarefas burocráticas, e nos fazem economizar tempo para demandas mais críticas. A camada de criação, revisão ou tomada de decisão humana sempre será necessária no Compliance. Com o uso da tecnologia cada vez mais amplo, essa atuação humana, por sua vez, se tornará cada vez mais estratégica.
*Luciana Silveira é Chief Compliance Officer na Neoway
Imagem: Freepik