As investigações internas corporativas devem ser conduzidas de forma profissional e bastante criteriosa. Inclusive, há riscos para as empresas e equipes envolvidas caso isso não ocorra. Por isso, é tão importante conhecer o contexto a qual cada empresa está inserida para que todas as análises sejam feitas de forma personalizada e também estipular previamente, através de política específica, quais serão os fluxos a serem seguidos e os procedimentos durante as investigações.
Pensando em apresentar esse assunto de maneira completa, vamos abordar não apenas os objetivos das investigações e a quais eventos são aplicadas, mas também alguns passos para que este pilar do programa de Compliance seja aplicado de forma eficaz.
Qual o objetivo de uma investigação interna corporativa?
Quando o assunto é Compliance, entendemos que as empresas precisam estar em conformidade com as leis e também devem agir de maneira ética com seus colaboradores, parceiros e clientes.
No entanto, nas relações corporativas podem ocorrer casos de condutas ilegais e irregulares. Nesse sentido, existe o programa de Compliance, com as investigações internas corporativas como um dos pilares mais fortes.
O principal objetivo das investigações é verificar se realmente ocorreu uma conduta ilegal ou contra as políticas da empresa e , ainda, identificar o(s) agente(s) envolvido(s), aplicar as sanções cabíveis e principalmente adotar as medidas de remediação necessárias para evitar a ocorrência de atos similares.
Saber sobre as condutas permite que a empresa interrompa irregularidades e defina a estratégia a ser tomada a partir desse momento. Por exemplo: uma companhia poderá reportar para as autoridades depois de conhecer os fatos ocorridos que violaram a lei internamente.
O Decreto nº 8420/2015 traz os elementos de um programa de Compliance efetivo, e determina a obrigação da empresa em ter um canal de denúncia e adotar, entre outras, medidas de interrupção e remediação de condutas irregulares.
Ou seja, para que esse programa seja efetivo, é necessário que haja investigações internas corporativas quando houver indícios da ocorrência de atos lesivos contra a Administração ou contra as políticas e procedimentos da organização.
A CGU (Controladoria Geral da União), na cartilha de setembro de 2015, que contempla o guia de integridade para entes privados, direciona as empresas para conduzirem as investigações internas de forma efetiva.
Quais eventos podem dar início às investigações internas corporativas?
Os eventos são diversos e podemos citar alguns. Muitos dos eventos surgem nos canais de denúncia, por isso são tão necessários. Também pode ocorrer em uma entrevista de desligamento, por exemplo, em que o responsável pelo setor de Recursos Humanos pode utilizar a situação para inserir perguntas sobre ética e Compliance, identificando possíveis condutas irregulares.
Outro evento que pode iniciar as investigações internas corporativas é quando algum colaborador entra com uma reclamação trabalhista por ser obrigado a fazer atividades escusas ou por ter sofrido assédio moral ou sexual, por exemplo.
Também temos casos de indícios de irregularidades decorrentes de Due Diligence de terceiros ou em operações de Fusão e Aquisição, pontos de não conformidade apontados pela a auditoria interna, ou até mesmo notícias que saíram na mídia sobre atos de corrupção.
Os eventos que podem dar início a uma investigação são os mais diversos possíveis, por isso, como um bom profissional da área de compliance é importante estar sempre atento.
Passo a passo para investigações internas corporativas
Como já citamos, cada contexto deve ser avaliado de forma particular, pois além dos contextos empresariais serem diferentes, as alegações sobre condutas a serem investigadas são diversas e cada uma deve ser analisada de maneira personalizada.
Mas, vamos abordar alguns passos que devem ser avaliados e aplicados, de acordo com o seu contexto:
1 – Definição de um canal de report independente
Quem vai ser o responsável pela investigação e por receber e analisar o resultado das investigações? Essa pergunta é crucial, pois a pessoa responsável precisa ter independência e também deve parecer independente perante a todos.
Muitas empresas contam com um comitê de Compliance formado por direção jurídica, de RH e financeira, por exemplo. Esse comitê pode resolver a maioria dos casos, exceto os que podem envolver alguém do próprio grupo ou uma pessoa próxima a algum dos integrantes.
Por isso, é importante ter mecanismos de governança que prevejam os conflitos de interesses.
Uma alternativa, inclusive bastante indicada para empresas familiares, que são comuns no Brasil, é a criação de comitês especiais formados somente por membros externos ou formados de maneira híbrida. Eles proporcionam maior independência e imparcialidade às investigações internas corporativas.
2 – Definição do escopo da investigação
O escopo deve conter os fatos que serão investigados, período a ser analisado, entre outros detalhes. É preciso que seja bem definido para ajudar a garantir a credibilidade da investigação.
Um escopo mal definido não traz credibilidade e pode gerar questionamentos de autoridades, caso a empresa esteja cooperando com elas. Assim como também pode gerar questionamento de auditores externos, caso esteja passando por Shadow Investigation.
Um detalhe é que durante a investigação outras descobertas poderão acontecer, havendo a necessidade de atualizar o escopo. Uma vez que uma empresa descobre mais pontos a serem investigados e tratados, ela não pode ignorar, mas deve atualizar o escopo de maneira responsável para lidar com eles.
3 – Preservação de documentos
A preservação de documentos eletrônicos e de documentos físicos deve ocorrer porque se a empresa optar por reportar para as autoridades, algumas perguntas poderão ser feitas, como:
- o que foi feito para preservar a documentação relevante?
- quando a documentação relevante foi preservada?
- o que foi preservado?
Ainda, é fundamental que a empresa garanta que os documentos serão preservados para a condução efetiva das investigações. Em algumas situações o acesso a algumas informações ou sistemas podem ficar suspensos.
Essa suspensão pode acontecer para reutilizar fitas de backup, entre outras ações que ajudam a garantir a integridade dos dados, pois eles podem revelar não só quem são os responsáveis, mas outros envolvidos.
4 – Revisão dos documentos
Por conta do volume de dados, as informações são revisadas com base nos critérios de busca, por meio de uma plataforma de revisão. Sendo assim, os critérios precisam ser definidos de maneira estratégica.
Por exemplo: vamos supor que a alegação é que o distribuidor X recebeu um desconto adicional para participar de uma licitação no ministério Y e que pagou propina. Então, nos critérios de busca, será interessante utilizar “distribuidor X” e outros pontos de pesquisas relacionados a ele e ao contexto dessa situação.
5 – Condução de entrevistas
Geralmente, as entrevistas acontecem em uma etapa mais avançada, quando a empresa já consegue ter uma compreensão melhor do que teria acontecido. Muitas vezes é feito dessa maneira para evitar retrabalho, já que a companhia pode ter que entrevistar mais uma vez algumas pessoas por ter descoberto outros detalhes durante os processos.
Mas, como falamos que cada investigação é feita de maneira personalizada, podem existir casos em que a entrevista deverá ser feita no início, para não perder nenhuma oportunidade. E também para conhecimento de determinado procedimento interno que será analisado.
Uma boa prática que queremos direcionar é a de fazer a entrevista com duas pessoas, pois uma poderá servir de testemunha e também poderá dar mais atenção para fazer anotações.
Outro lembrete que pode fazer a diferença é que os entrevistados não precisam ser somente quem provavelmente esteja envolvido de forma direta com o caso investigado. Algumas outras pessoas ligadas ao caso ou que tenham trabalhado com os envolvidos, talvez tenham informações relevantes para compartilhar.
6 – Análise financeira
Esse ponto não vai existir em todas as investigações internas corporativas, pois, dependendo da natureza da alegação, não haverá a necessidade de avaliar esse aspecto financeiro.
Mas, caso ocorra, é importante fazer uma análise precisa, evitando generalizações e especulações. Por exemplo: se a alegação é que o distribuidor recebeu um desconto adicional, é preciso avaliar quais descontos foram dados, a média de descontos recorrentes e quais os que destoaram e em que contexto isso aconteceu.
7 – Medidas de remediação
A partir do momento em que a empresa encontrar problemas ou potenciais questões de irregularidade, é preciso tomar medidas para sanar e evitar que aconteça novamente. Esse cuidado deve ser recorrente, já que um programa efetivo de Compliance é como um organismo vivo e não para de se movimentar.
8 – Relatório da investigação
No relatório, é preciso apresentar informações como as alegações iniciais, sumário executivo com um resumo das investigações, escopo com períodos especificados, metodologia abordada, descrição dos fatos de forma detalhada com base no que foi encontrado em cada etapa e as recomendações e medidas de remediação.
Caso você seja de escritório de advocacia, talvez seu cliente também queira uma análise jurídica.
Lembre-se de que o texto do relatório deve ser preciso, imparcial e sem especulações e generalizações. Além disso, a distribuição desse relatório deve ser feita somente para quem realmente precisa recebê-lo, garantindo o sigilo dos trabalhos.
Aprofunde-se no assunto
Apesar de ter conhecido neste artigo os principais passos, não há nada melhor do que aprender sobre o tema com profissionais renomados que têm experiências diárias com investigações internas corporativas.
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Redação LEC
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