No mês passado, seguindo uma tendência que já vinha se delineando desde os questionamentos referentes à ética e à integridade partidária surgidos nas eleições de 2014, um dos partidos políticos que teve representante no segundo turno da última disputa presidencial decidiu que incluirá a implantação de um sistema de Compliance (eleitoral – no qual um dos principais pilares trata-se da realização de uma due diligence da origem das doações recebidas) em seu novo estatuto (a ser aprovado no Congresso Nacional de seus integrantes).
Além da essencial questão da atenção às “demandas das ruas” (eleitores) por mais ética no jogo político, a adoção de um programa de Compliance voltado para a questão eleitoral também se torna quase que obrigatória para os partidos que ambicionem disputar os processos eleitorais por vir por conta de dois aspectos em especial.
Primeiro, já desde de 1965, a Lei nº 4.737 previa em seu art. 350 o delito de ocultação de doações recebidas, supostamente, em benefício de campanha eleitoral (o tão comentado “Caixa 2”). Não obstante, em recente posicionamento, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pelo recebimento de denúncia ofertada em razão de irregularidades que estariam presentes no recebimento, devidamente declarado, de doações (“Caixa 1”) para a campanha que elegeu o Senador Valdir Raupp.
Nesse contexto, a inserção de práticas de Compliance eleitoral nos partidos brasileiros se revela essencial não só para uma maior garantia da correta declaração da globalidade das doações recebidas por eventual campanha (adequando-a às disposições da Lei nº 4.737/65) mas também se revela importante para a realização de uma due diligence nos terceiros doadores, ou seja, a execução de um procedimento para verificar a origem lícita dessas doações.
Essa “devida diligência” ao avaliar recursos oriundos de terceiros que creditem o programa político apresentado pelo partido, possuiria, ao menos, um duplo aspecto. Um primeiro seria uma análise subjetiva do doador (quem está doando?): existe algum interesse escuso por trás dos valores destinados à campanha? Ele pretende obter alguma vantagem indevida com a doação destinada (execução de obra, benefícios fiscais etc.)?
Um segundo ponto seria quanto à “qualidade” desses valores: é possível aferir/comprovar a origem lícita do montante doado? Ou é possível que a campanha esteja sendo um meio para a execução da prática de “lavagem de capitais” (concessão de aparência lícita a valores obtidos de forma ilícita), ainda que sem desígnio de vontades por parte dos responsáveis do partido político?
As questões aqui trazidas são de especial relevância para os players que pretendam adequar o jogo político às demandas populares e de mercado surgidas, de forma mais latente, desde as eleições de 2014, sob pena de serem abarcados no conceito de “velha política”, aumentando exponencialmente o risco de verem seu partido e seus representantes se tornarem obsoletos nas futuras disputas eleitorais.
A sociedade e o mercado já anunciam há tempos o processo aqui citado de transformação em suas expectativas para com os players políticos, tornando o acompanhamento da referida alteração verdadeira condição para a sobrevivência política dos partidos que aspirem manter/galgar representatividade no cenário político nacional.
André H. Paris é advogado associado e consultor de Compliance do Peter Filho, Sodré & Rebouças – Advogados. Pós-graduado em Ciências Penais, é membro do Instituto Capixaba de Criminologia e Estudos Penais (ICCEP)