Investigar casos de assédio no ambiente de trabalho é uma responsabilidade delicada e crucial para qualquer organização comprometida com a ética e a conformidade. A maneira como essas investigações são conduzidas internamente pode ter um impacto significativo na cultura organizacional, na confiança dos colaboradores e na reputação da empresa.
Neste artigo, vamos explorar o processo de investigação de assédio, com dicas práticas e informações valiosas para garantir que tudo seja realizado com seriedade e profissionalismo.
Por que investigar casos de assédio é crucial para o Compliance?
A investigação de assédio é um componente fundamental do Compliance, assegurando que a organização esteja em conformidade com suas obrigações legais e éticas, abordando questões que podem não ser imediatamente perceptíveis, mas que são igualmente críticas – como é o caso do assédio e da discriminação, por exemplo.
Receber denúncias sobre assédio e não apurar adequadamente ou iniciar a investigação e não a concluir, pode resultar em sérias consequências legais, danos à reputação e perda de confiança entre empregados, fornecedores e clientes. Não obstante, a investigação bem conduzida não apenas identifica e resolve os problemas, como demonstra o compromisso da empresa ou instituição com o ambiente de trabalho seguro e respeitoso.
Além disso, essas investigações são fundamentais para proteger a empresa ou instituição contra possíveis litígios e sanções. Ao agir prontamente e de forma justa, a organização pode mitigar os riscos associados ao assédio e mostrar aos empregados e stakeholders que não tolera comportamentos inadequados, reforçando assim sua cultura de integridade.
Preparação para a investigação
Antes de iniciar uma investigação de assédio, é importante ter políticas claras, uma equipe investigativa competente e processos bem definidos para conduzir o processo de maneira imparcial e eficaz.
Estabelecimento de políticas claras
A investigação de assédio deve começar muito antes do recebimento da denúncia, e um ponto crucial é a elaboração da política interna que trata do assédio, lembrando que estas normas internas devem ser claras e acessíveis a todos.
Essas políticas devem ser parte integrante do Código de Conduta da empresa ou instituição, devem ser revisadas periodicamente e amplamente divulgadas aos colaboradores e toda rede, interna e externa, de relacionamento.
Importante dizer que, mais do que criar políticas, vale sempre a revisão daquelas normas internas que a empresa ou instituição possui. Um código de conduta robusto estabelece as expectativas de comportamento e fornece um guia claro sobre como os casos de assédio serão tratados.
Canal de denúncias e coleta de informações
A coleta de informações é uma etapa crítica na investigação de casos de assédio, porque envolve o recebimento da denúncia, o planejamento da investigação e a condução de entrevistas com as partes envolvidas, incluindo testemunhas, a vítima e o suspeito(a).
O primeiro passo é o recebimento da denúncia. A empresa ou instituição deve oferecer mecanismos acessíveis e seguros para que os colaboradores possam relatar casos de assédio, como canais de denúncia anônimos. É preciso pensar em proteger o denunciante de boa-fé, para que ele sinta liberdade em compartilhar informações sobre pontos tão sensíveis e muitas vezes pessoais.
Depois disso, ao receber a denúncia, é fundamental agir rapidamente e seguir protocolos pré-definidos ao iniciar a investigação. Nesse sentido, há a necessidade trabalhar com o planejamento interno de apuração de denúncias, que envolve definir os objetivos e o escopo do processo, identificar as partes envolvidas e as testemunhas relevantes. Um plano bem estruturado ajuda a manter a investigação focada e eficiente, garantindo que todas as áreas críticas sejam abordadas de forma sigilosa e imparcial.
Análise e conclusão
Após a coleta de informações, a etapa seguinte é a análise e avaliação das evidências, um processo importante para construir a solidez do caso e tomar decisões assertivas.
A organização e a documentação detalhada das informações são essenciais para manter a integridade da investigação, facilitando a análise com o uso de ferramentas e técnicas específicas. Na avaliação das evidências, é preciso comparar diferentes relatos e identificar inconsistências para estabelecer a veracidade das declarações e obter a narrativa coerente dos eventos recebidos, seja de forma anônima ou identificada.
Em determinados casos, pode ser necessário envolver especialistas externos, como consultores jurídicos, para fornecer a segunda opinião e garantir que todas as nuances sejam consideradas, fortalecendo o processo de apuração. Concluída a análise, a investigação deve ser formalmente encerrada com a elaboração do relatório final, que deve ser claro, conciso e bem estruturado, incluindo as evidências, depoimentos, conclusões e as recomendações do investigador daquele caso.
A comunicação dos resultados deve ser feita com cuidado, compartilhando as informações com as partes relevantes enquanto se preserva a confidencialidade dos envolvidos. Por fim, a empresa ou instituição deve implementar ações corretivas e preventivas, como medidas disciplinares e revisões de políticas e procedimentos internos, bem como treinamentos, para evitar a recorrência de casos semelhantes no futuro.
Quais as principais diferenças práticas nas investigações de casos de assédio com outros tipos de denúncias?
Para aprofundar nosso assunto, conversamos com Cleber Izzo, que além de ser Professor da LEC, é advogado e escritor, pós-graduado em Direito do Trabalho, com especialização em Liderança Sindical & Empresarial – FGV e MBA em Gestão de Pessoas – FIA/USP. Possui mais de 20 anos de experiência em RH & Compliance nos setores Público e Privado. Foi Head de Investigações Especiais na América do Sul. Atualmente é Coordenador de Investigações de Fraude e Compliance na Comissão do Acadêmico de Direito da OAB.
Segundo Cleber: “Quando recebemos denúncias relacionadas aos casos de assédio, há a necessidade de apurarmos com o devido sigilo e respeito, sem pré-conceitos, seja para vítimas, testemunhas ou investigados. Costumo dizer que a área de Compliance possui papel fundamental nas apurações porque muitas vezes seremos a última instância entre a continuidade daquela relação de emprego ou não, e por isso que tratar as pessoas como pessoas e não pelo cargo que ocupam faz toda diferença!”.
Continuou:
“A recente pesquisa realizada pela consultoria Aliant (ICTS), dentre os canais de denúncias que opera, analisou mais de 665 mil relatos em 710 grupos empresariais no período de 2018 a 2023, e constatou que o número de casos relacionados a descumprimento de políticas diminuiu, porém, os casos relacionados ao assédio aumentou 13%, em comparação apenas entre os anos de 2022 a 2023, e isto tem sido reflexo no Poder Judiciário brasileiro que registrou um aumento de processos trabalhistas de 9%, apenas na Primeira Instância e este número sobe para 17% quando apurados em Segunda Instância”.
Por isso, é necessário compreender que:
“Na prática, diferentemente dos casos de fraude, que podemos trabalhar com evidências numéricas e documentais, os casos de assédio nem sempre são evidenciados por meio de provas físicas ou eletrônicas, o que exige do profissional de Compliance a habilidade da empatia, persuasão, escuta ativa e o direcionamento do foco na pessoa, pois a linguagem corporal alinhada ao questionário bem elaborado poderá ser decisivo na investigação”.
Como se destacar na área de investigações
O campo das investigações de assédio está em constante evolução, com novas tecnologias e melhores práticas emergindo regularmente.
Por isso, um bom profissional precisa estar atualizado quanto ao uso de ferramentas digitais para coleta e análise de dados. Esse profissional precisa ir além do perfil executor, pois precisa pensar em tecnologias que possam aumentar a eficiência do processo e fornecer novas maneiras de analisar informações, sem perder o olhar sensível a cada caso.
Além disso, Cleber Izzo completou: “a capacitação individual é fator primordial de sucesso e é um importante diferencial de carreira, seja para profissionais que já atuam com as investigações internas ou para aqueles que estão em transição de carreira”.
Completou:
“A depender da estrutura da empresa ou instituição, o profissional de Compliance poderá trabalhar com um time reduzido, multifuncional ou até mesmo multicultural, e neste caso, deverá ter o apoio da alta administração e contar com o suporte de outras áreas para apurar adequadamente às denúncias recebidas, desta forma, vale destacar a importância de saber se relacionar, estudar sobre comportamento humano, conhecer o segmento que atua e escolher e capacitar as pessoas suportarão o processo sigiloso de investigações”.
Tendências para ficar de olho e se posicionar à frente da concorrência
Izzo ainda indicou algumas tendências para que os profissionais possam ficar atentos:
“A Inteligência Artificial chegou para ficar e está em crescimento exponencial de utilização, porém, mais do que esperar respostas e saber fazer as perguntas certas, jamais substituir o cérebro humano no processo de apuração de denúncias de assédio”.
Ressaltou também dois assuntos relevantes que estão na pauta do Brasil:
“O Projeto de Lei, PLS 1521/2019, que foi aprovado pela Câmara e Senado Federal, está para apreciação do Presidente da República e, caso seja sancionado, os casos de assédio moral passarão a ser crime no Brasil. Outro ponto importante é a exclusão do artigo 1° da Convenção 190 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, que exclui um dos elementos da caracterização do assédio que é a repetição, regularidade, ou seja, para a OIT, basta uma ocorrência e poderá ser caracterizado o assédio, também neste caso o Brasil ainda não referendou o assunto”.
Completou:
“Com a promulgação da Lei nº 14.457/2022, que alterou a nomenclatura da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA para Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio – CIPA, abordando inclusive a necessidade de inclusão de temas nas práticas da CIPA e a realização, a cada 12 meses, de ações de capacitação e sensibilização aos empregados, isto reforça a importância do tema e fomenta a necessidade de criar a cultura do respeito e da integridade nas empresas”.
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