Brasil caiu 10 posições no Índice de Percepção da Corrupção e ficou na 104ª colocação entre os 180 países avaliados
Se propor à iniciativa de mensurar o volume dos atos corruptivos não é uma tarefa fácil, tão pouco simples. O primeiro desafio está em definir o termo “corrupção”. Certamente não deve ser considerado apenas, embora absolutamente problemático, o suborno de agentes públicos. Em um conceito amplo, mas pouco tangível, corrupção seria o abuso de um poder confiado a alguém, com a finalidade dessa pessoa obter benefícios pessoais e a pessoas relacionadas.
Mas quais são os atos corruptivos?
Seguir apenas pelo caminho legalista seria complexo e tortuoso. Já que no Brasil, por exemplo, corrupção e suborno de agentes públicos são sinônimos aos olhos do Código Penal. A própria legislação criminal prevê outros delitos contrários aos interesses da administração pública, os quais são relacionados como atos corruptivos aos olhos da sociedade, como a advocacia administrativa (“patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário”) e o tráfico de influência (“solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função”).
De mais a mais, há uma séria de condutas que são atípicas em nosso país (ou seja, não configuram crimes), embora sejam perceptíveis como atos corruptivos, à exemplo do suborno de agentes privados e diversas hipóteses de conflitos de interesses.
Talvez um bom caminho seja analisar pelos efeitos ou consequências. Assim, atos corruptivos seriam aqueles que lesam direitos e garantias fundamentais, como:
a) acesso a direitos sociais (e.g., saúde, educação, transporte e segurança pública de qualidade);
b) as diversas formas de liberdade (e.g., expressão, ir e vir, consciência e de crença, etc.);
c) os direitos políticos (e.g., acesso isonômico a candidaturas que não sejam beneficiadas por ilícitos, como a compra de votos e financiamento indevido de campanha);
d) acesso a oportunidades (e.g., a chance de viver em um ambiente saudável, de ter um futuro sustentável, de construir e aumentar a riqueza, de ser feliz).
Talvez por esse motivo, o Índice de Percepção da Corrupção ou Corruption Perceptions Index (CPI), o principal indicador de corrupção do mundo, produzido pela Transparência Internacional desde 1995, agrega dados oriundos de diferentes fontes que trazem as percepções do nível de corrupção no setor público em cada um dos 180 países analisados.
São atualmente 13 fontes que captam a avaliação de especialistas e executivos empresariais sobre uma série de comportamentos corruptos no setor público, como o suborno de agentes públicos, desvio de recursos públicos, a utilização de cargos públicos para ganhos privados, nepotismo na função pública, e utilização da atuação estatal para benefícios particulares.
Algumas das fontes também analisam os mecanismos disponíveis para prevenir a corrupção num país, tais como a capacidade do governo de aplicar mecanismos de integridade; a responsabilização eficaz de agentes corruptos; a burocracia e a carga burocrática excessiva; a existência de leis adequadas sobre questões financeiras relacionadas aos ilícitos; prevenção de conflitos de interesse; acesso à informação; e a proteção legal para denunciantes, jornalistas e investigadores.
Cada uma das fontes de dados utilizadas para calcular o IPC é avaliada segundo os seguintes critérios:
a) confiabilidade metodológica e reputação institucional;
b) alinhamento conceitual dos dados;
c) as escalas utilizadas devem permitir diferenciação suficiente nos níveis percebidos de corrupção entre países;
d) comparabilidade entre países e por determinado período (são excluídas fontes que capturam percepções de corrupção para um único momento, mas que não são concebidas para serem repetidas ao longo do tempo).
A metodologia segue quatro etapas: seleção dos dados de origem, reescalonamento de tais informação, acréscimo de dados reescalonados e, em seguida, comunicação de uma medida de incerteza. O processo de cálculo também incorpora um mecanismo rigoroso de controle de qualidade que consiste em cálculos paralelos independentes conduzidos por pesquisadores internos e consultores acadêmicos sem nenhuma afiliação à organização.
Mas mensurar a corrupção não é uma tarefa fácil. E o principal motivo está no fato de que a conduta não acontece à luz do dia, mas no submundo dos relacionamentos espúrios daqueles que trazem seus interesses pessoais acima dos direitos coletivos e garantias fundamentais, e que não querem se expor em razão disso. Daí a inteligente escolha pela percepção.
Criticar o valoroso estudo, para falta de precisão no dimensionamento da corrupção, é jogar uma cortina de fumaça sobre o problema, muito mais complexo que a metodologia adota. A corrupção está em condutas que se repetem diariamente, nas mais diferentes realidades, nórdica ou subsaariana. E isso precisa mudar!
De igual forma, se resignar dos resultados frustrantes dos indicadores, ano após ano, com mensagem prontas, como “eu já sabia” e “sempre é assim”, não mobiliza da forma necessária para encontramos as soluções. Como fomenta a própria Transparência Internacional, “a corrupção não é parte da cultura de nenhuma sociedade, nem da essência política. E o Brasil, unido, pode vencer.”
Somos mais de 203 milhões de agentes de transformação. Mas cada pessoa deve exercer esse papel. Pense nisso!