Um estudo recente produzido pela banca global Baker Mckenzie sobre como gestores de Compliance de diferentes países estão adotando ferramentas tecnológicas em suas empresas mostra que os profissionais brasileiros estão, em muitos aspectos, a frente dos seus colegas em outras partes do mundo.
Segundo o estudo Connected Compliance 2020, os Compliance Officers brasileiros estão entre os que mais já fazem uso de tecnologias para diferentes atividades da área. No caso de ferramentas de gestão da informação e de documentação (como o eDiscovery), 60% dos gestores locais consultados disseram fazer uso delas. Na África esse percentual é de 57%, enquanto nos Estados Unidos 54% dos gestores de Compliance dizem fazer uso dessas ferramentas.
No caso da gestão de casos e acordos, ferramentas digitais para o acompanhamento são utilizadas por 54% dos gestores de Compliance – tanto no Brasil como nos Estados Unidos. As interfaces digitais para treinamento e gestão de conhecimento (incluindo app’s e microsites dedicados) representam a tecnologia nos quais os brasileiros obtém a maior distância em sua adoção na comparação com o resto do mundo. Essas soluções são aplicadas por 57% dos gestores locais, ante 49% dos norte-americanos e 43% dos gestores na França, respectivamente o segundo e o terceiro (proporcionalmente) país na adoção dessas tecnologias.
Os brasileiros também estão na frente quanto à adoção de tecnologias baseadas em inteligência artificial e machine learning, que segundo a pesquisa já são adotadas por 46% dos gestores locais. Entre os outros mercados pesquisados, apenas os Estados Unidos alcançam percentual acima de 40% em ambos os casos (44% para soluções baseadas em inteligência artificial e 42% para machine learning). Em todos os outros países e regiões a adoção dessas tecnologias atualmente está na casa dos 30% no caso de inteligência artificial. Já as soluções baseadas em machine learning estão na casa dos 20%, excluindo o Reino Unido (34%) e China e Hong Kong (37%).
As únicas ferramentas de tecnologia na qual os gestores brasileiros não estão na ponta são as de análise preditiva, adotada por 43% dos respondentes da pesquisa lotados no Brasil, ante 53% dos gestores de Compliance baseados em Cingapura e 50% dos norte-americanos; além de ferramentas de alertas regulatórios, utilizado por 55% dos profissionais de conformidade na Alemanha, por 54% dos gestores no Oriente Médio e por “apenas” 47% dos líderes da área por aqui.
Investimentos futuros
Sobre as tecnologias planejadas para serem implementadas nos próximos dois ou três anos pela área, os brasileiros mantém bom posicionamento no ranking – mesmo já liderando o uso dessas tecnologias. O percentual é particularmente alto para as soluções baseadas em inteligência artificial, a qual 26% dos gestores de Compliance brasileiro respondentes da pesquisa pretendem adotar nos próximos anos, ficando atrás apenas dos 27% de gestores baseados no Oriente Médio e dos 28% de profissionais na África que pretendem fazer o mesmo.
Em termos de valores destinados aos investimentos, os profissionais brasileiros parecem otimistas em relação à disponibilidade de orçamento para a área de Compliance nos próximos anos. 26% dos gestores locais acreditam investir entre US$ 8 milhões e US$ 10 milhões em novas tecnologias de Compliance. Em contraponto, o País também é o que alcança o maior percentual relativo na outra ponta, com 24% dos respondentes locais planejando investir entre US$ 500 mil e US$ 1 milhão. Outros 18% de gestores locais acreditam que irão investir entre US$ 1 milhão e US$ 3 milhões; 14% investirão entre US$ 3 milhões e US$ 5 milhões e 13%, entre US$ 5 e US$ 8 milhões. Considerando o dólar acima dos R$ 5, os números mostram um mercado bastante aquecido para negócios. Na maior parte dos países, os investimentos estão concentrados nas faixas entre US$ 1 milhão e US$ 8 milhões.
Entre as barreiras para a adoção de tecnologias, ou novas tecnologias, pelas áreas de Compliance no Brasil, o maior desafio apontado é o fato de esses gestores acreditarem que ainda existe valor a ser realizado com as tecnologias já compradas.
Os resultados foram obtidos pelo Baker Mckenzie por meio de sua ferramenta de avaliação Connected Compliance, que é abastecida por mais de 1500 entrevistas com Chief Compliance Officers e Heads da área em diferentes países e indústrias. Da base analisada na pesquisa, os brasileiros respondem por 6% do total de respondentes.
R$ 17,9 bilhões em benefícios
Esse é o valor apontado pela CGU no Relatório Consolidador dos Benefícios Aprovados em 2020 obtidos pelos gestores públicos federais ao aplicarem recomendações relativas à área de Auditoria Interna Governamental emitidas pela Controladoria. Os R$ 17,9 bilhões em benefícios financeiros obtidos no ano passado representam um incremento de 38% em comparação ao resultado de 2019. A atividade de auditoria interna governamental entende como benefício o impacto positivo observado na gestão pública a partir da implementação, pelos gestores públicos, de recomendações emitidas por auditores internos governamentais.
O relatório da CGU compara esses valores contabilizados em benefícios financeiros a partir da adoção, pelos gestores públicos, das recomendações emitidas pela Controladoria com o valor utilizado pela CGU para o seu respectivo funcionamento. No ano passado, o retorno obtido segundo a metodologia da pasta foi de R$ 15,95 para cada R$ 1 utilizado pelo órgão. O número é seis vezes maior que o alcançado em 2015.
Os benefícios financeiros refletem melhor eficiência do gasto público. Além de valores efetivamente recuperados aos cofres públicos, ele soma valores de recursos economizados com o aprimoramento de execução de políticas públicas, melhorias de processos de trabalho e cessação do pagamento de benefícios indevidos.
Dentre as ações que mais geraram benefícios financeiros estão a redução nos valores licitados e contratados (mantendo a quantidade e qualidade dos bens e serviços), equivalente a mais de R$ 2,3 bilhões; a eliminação de desperdícios ou redução de custos administrativos, equivalente a cerca de R$ 2,1 bilhões; e o cancelamento de licitação ou contrato com objeto desnecessário, inconsistente ou inadequado tecnicamente, que resultou em torno de R$ 2,4 bilhões em benefícios financeiros.
De acordo com o órgão, o desempenho de 2020 se mostra coerente com a evolução histórica dos valores registrados em benefícios financeiros obtidos. O número evolui de forma consistente desde 2015, quando teve início o alinhamento internacional das práticas de auditoria interna. O avanço foi fortalecido a partir de 2017, com a publicação do novo referencial da atividade de auditoria interna governamental, a IN 03/2017, que a define como uma atividade independente e objetiva de avaliação e consultoria para adicionar valor e melhorar as operações a partir da aplicação de uma abordagem sistemática e disciplinada para avaliar e melhorar a eficácia dos processos de governança, de gerenciamento de riscos e de controles internos.
Departamento empoderado
Mesmo num cenário de pandemia, a unidade do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) responsável pela aplicação do FCPA – a legislação norte-americana de combate à corrupção de agentes públicos no exterior –, gerou um valor recorde de US$ 7,84 bilhões por meio da aplicação de multas a empresas de diferentes nacionalidades por casos de má conduta corporativa ao redor do mundo. E mesmo sob uma nova administração, nada indica que o ritmo de enforcements deve mudar nos próximos anos. Pelo contrário. De acordo com uma reportagem publicada pelo Risk & Compliance Journal (do Wall Street Journal), a unidade responsável pela aplicação do FCPA, alcançou um número recorde de 39 promotores.
A unidade também reforçou o time de profissionais especializados em Compliance. Recrutados no mercado esses profissionais apoiam os promotores na definição de estratégia, análise e políticas em relação aos programas de Compliance corporativo, além de apoiar os promotores nas investigações e na preparação da acusação entre outras funções.
Eles também trazem para o departamento uma visão do outro lado, entendendo a dinâmica e os desafios enfrentados pelas empresas e sobre as próprias exigências do departamento, nem sempre factíveis dentro da realidade corporativa.
Segundo a mesma reportagem do Risk & Compliance Journal, a mais recente adição ao time de especialistas do DoJ é a advogada Lauren Kootman, ex-sócia da prática de Compliance e Investigações do escritório norte-americano Orrick, Herrington & Sutcliffe. De acordo com o Journal, Kootman atuou na equipe de monitoramento que supervisionou a petroquímica brasileira Braskem e esteve ao lado da Zimmer Biomet, trabalhando com a empresa de dispositivos médicos na implementação das recomendações de conformidade impostas pelo monitor externo.
A presença de profissionais de mercado especialistas em Compliance teve início em 2015, com a contratação de Hui Chen, ex-diretora de Conformidade de empresas como Pfizer e Microsoft. Com a sua saída, em 2017, optou-se por um novo caminho ao deixar de ter uma única pessoa como especialista para adotar uma estratégia que envolve a contratação de mais profissionais como Kootman e o treinamento em Compliance dos próprios quadros do Departamento de Justiça.
Acusando por corrupção privada
O Serious Fraud Office (SFO), órgão britânico responsável por investigar a processar casos de fraude e corrupção corporativa no país e no exterior acusou o ex-trader de combustíveis da Greenergy, Gianni Rivera, de fraude e lavagem de dinheiro em conexão com sua investigação sobre o setor de biocombustíveis. Segundo o SFO, ao negociar acordos comerciais entre Greenergy e a Biodiesel Kampen BV, um parceiro comercial holandês, Rivera recebeu pagamentos indevidos de Cornelis Bunschoten, diretor da empresa holandesa. De acordo com a acusação do regulador britânico, em vários momentos, parte do dinheiro teria retornado a Bunschoten por meio de depósitos para empresas ligadas ao holandês.
O SFO havia aberto uma investigação em relação a alguns aspectos do comércio de biodiesel da Greenergy com vários terceiros em dezembro de 2018, com o anúncio público da investigação em maio de 2019. Embora a Greenergy não seja mais considerada suspeita na investigação, ela segue ativa, em conjunto com as autoridades holandesas. A Biodisel Kampem declarou falência em agosto de 2019 e seu antigo proprietário cumpre sentença por lavagem de dinheiro e fraude por negociar biodiesel não-sustentável como se sustentável fosse. Outra companhia holandesa, a Sunoil Biodisel adquiriu a unidade de produção e outras propriedades da Biodisel Kampem.
Diagnóstico francês
Uma pesquisa conduzida pela Agência Francesa Anticorrupção (AFA) com quase duas mil empresas de todos os setores e portes, apresentou um diagnóstico dos sistemas de Compliance nas empresas em 2020. De acordo com os dados obtidos pelo órgão, 70% das empresas respondentes já estabeleceram um sistema anticorrupção, sendo que 48% dos respondentes implementaram seus programas anticorrupção de três anos para cá, após a publicação da Sapin 2, a legislação anticorrupção corporativa gaulesa que estabelece a obrigatoriedade desses programas para grandes e médias empresas em operação no país. Essas companhias obrigadas respondem por 46% da base da pesquisa.
A jovialidade dos programas de Compliance anticorrupção na França fica demonstrada em alguns dados da pesquisa. Menos da metade das empresas, 48%, contam com um profissional dedicado à função de Compliance Officer. Mas, os colegas ainda não desfrutam de grande prestígio por lá. Segundo o estudo, nas empresas que possuem a função, só em 25% dos casos os profissionais que ocupam a cadeira dão opinião nos projetos estratégicos da empresa e apenas 28,5% deles tem assento no comitê executivo. Uma curiosidade é que nas empresas que contam com Compliance Officer, em apenas 36,4% dos casos a posição está identificada no organograma. Considerando apenas as grandes e médias empresas, 76% contam com um profissional de Compliance, enquanto nas empresas pequenas não obrigadas a contarem com o programa, em 27% delas existe a figura do Compliance Officer.
85% das respondentes dizem que suas empresas contam com um código de conduta, mas só 56% estabeleceram com medidas de treinamento e prevenção, mesmo percentual das que contam com sistemas de controles internos. O canal de denúncias está presente em 61% dos negócios que responderam a pesquisa, enquanto um mapa de riscos de corrupção está presente em 56% delas. Procedimentos de due dilligences em terceiros, um dos pontos focais de corrupção internacional, é uma realidade em apenas 39% das companhias francesas.
Entre as grandes e médias empresas obrigadas, apenas 64% delas alertam profissionais de todos os níveis hierárquicos da companhia sobre os riscos de corrupção, um ponto que o guideline da AFA aponta como fundamental.
De acordo com os respondentes, a integração dos riscos de corrupção aos procedimentos de negócios das empresas aconteceu em 46% das empresas, outras 38% das companhias integraram os riscos parcialmente.
Entre outros achados da pesquisa, a AFA aponta que 22% das empresas participantes da pesquisa reportaram um caso de corrupção nos últimos cinco anos. Em 51% desses casos, as empresas tomaram medidas disciplinares e impuseram sanções, mas apenas 20% dessas fizeram acusações formais e, desse montante, 11% obtiveram uma condenação. Considerando apenas as grandes e médias empresas, 67% delas iniciaram ao menos um procedimento disciplinar e 60% impuseram ao menos uma sanção disciplinar.
Publicado originalmente na edição 31 da Revista LEC.
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