Com o aumento de preocupações relacionadas a environmental, social and governance (ESG), as empresas têm enfrentado crescente escrutínio. O verdadeiro impacto das práticas de ESG no meio ambiente, na sociedade e nas empresas, porém, ainda é nebuloso, principalmente devido às várias maneiras de avaliar a sua efetividade. Agências regulatórias nos Estados Unidos e no Reino Unido têm criado medidas proativas visando diferenciar práticas de ESG reais e significativas daquelas meramente cosméticas. Na última década, ESG se tornou tema relevante também no Brasil; nesse sentido, é preciso estabelecer medidas para mensurar tais práticas à luz da exposição do Brasil a regulações internacionais.
Em abril de 2023, a Comissão dos Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu aprovou a Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa (CS3D), que procura aumentar a responsabilidade corporativa das práticas de ESG em relação a impactos no meio ambiente e nos direitos humanos, o que inclui as subsidiárias e as cadeias de valor. O arcabouço jurídico da CS3D ainda é novo, mas nasce de leis nacionais que asseguram os direitos humanos em subsidiárias e a gestão de risco de terceiros. Estas leis incluem o Supply Chain Due Diligence Act na Alemanha, de janeiro de 2023, e a Lei Potier na França, de março de 2017. Ambas mostram avanços, mas não definem a proporção em que a responsabilidade corporativa deve considerar os impactos econômicos e os impactos sociais de uma empresa.
A CS3D mapeia o caminho da responsabilidade corporativa, a qual inclui a identificação, prevenção, mitigação e responsabilização de empresas por seus impactos e operações. Ao exigir uma due diligence aprofundada, a CS3D obriga as empresas a incorporarem o conceito de sustentabilidade em suas agendas, operações e cadeias de valor. Sob a CS3D, violações podem sofrer punições como multas, sanções e decisões administrativas. Além disso, a diretiva possibilita que vítimas de empresas que violam os direitos humanos e o meio ambiente sejam compensadas por meio de ações cíveis contra as empresas.
O arcabouço regulatório do Brasil é relativamente completo em termos de responsabilidade corporativa relativa às práticas de ESG, porém não endereça ações de subsidiárias e das cadeias de valor. A Lei das S.A. (nº 6.404/1976) requer que empresas publiquem informações sobre ESG em seus relatórios anuais. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) também criou regulações específicas para aumentar a transparência das práticas de ESG; a instrução de 2009 (nº 480/2009) obrigou que empresas tornassem públicas suas iniciativas ambientais, sustentáveis e sociais. Esta instrução, em particular, vai ao encontro do comprometimento do Brasil em encabeçar discussões globais sobre mudanças climáticas.
Historicamente, as regras de compliance no Brasil foram influenciadas pela UE, um dos maiores parceiros comerciais do Brasil. Para estabelecer boas relações comerciais com a UE, o Brasil aprendeu a adotar aspectos dos padrões europeus de compliance, inclusive leis ambientais e trabalhistas rígidas. Por exemplo, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD; nº 13709/2018) foi inspirada no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da UE (GDPR; Regulamento (UE) 2016/679). Algumas definições jurídicas centrais, como o significado de dados pessoais, foram reproduzidas no Brasil exatamente como na versão europeia.
Apesar destes regulamentos aparentemente robustos, a implementação das práticas de ESG permanece um desafio para as empresas no Brasil. As leis e regras existentes, incluindo os exemplos supracitados, estabelecem, de forma clara, a responsabilidade corporativa de sócios e administradores; no entanto, elas indicam que é preciso agir no interesse de todos os stakeholders de uma empresa – grupo cuja identificação não é precisa, e, portanto, difícil de definir legalmente. Por exemplo, faltam à LGPD brasileira certos parâmetros existentes na GDPR europeia, como a qualificação de dados sensíveis e dados pessoais que permitem a identificação de indivíduos. Estas lacunas conceituais resultam na interpretação divergente das leis, o que frequentemente impede a consistência no seu monitoramento e fiscalização.
As diretivas europeias têm, historicamente, ajudado o Brasil a definir o seu próprio arcabouço regulatório, mas mensurar a efetividade das práticas de ESG é ainda um obstáculo. Estas diretivas requerem instituições robustas, sobretudo em jurisdições onde mecanismos de fiscalização não são tão rigorosos. O Brasil precisa ainda alinhar o arcabouço regulatório de ESG à sua realidade. Problemas ambientais oriundos da falta de fiscalização, assim como dificuldades de governança e desigualdades sociais, evidenciam uma segunda lacuna: aquela entre o compliance corporativo e a vida da maioria dos brasileiros. A instabilidade política é também um desafio para a efetividade e consistência das práticas de ESG devido às recorrentes mudanças de prioridade.
Esforços conjuntos entre as agências regulatórias e as empresas, portanto, são centrais para a criação de modelos alinhados a regimes regulatórios internacionais que conversem com os desafios únicos do Brasil. Embora ainda seja cedo para entender a influência da CS3D em empresas não-europeias, o mapeamento detalhado da diretiva para empresas, assim como o seu foco em identificar problemas nas cadeias de valor, podem facilitar a fiscalização de autoridades para efetivamente incorporar práticas de ESG.